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Um pé na porta (parte I)

get a/your foot in the door

to enter a business or organization at a low level, but with a chance of being more successful in the future:

Making contacts can help you get a foot in the door when it comes to getting a job.

Uma das minhas expressões preferidas em inglês é esta. “Get your foot in the door”. A sua aplicação não está muito distante da tão portuguesa “está com um pé dentro”, que significa que um processo está bem encaminhado.

Para a exposição que se segue, opto por uma adaptação do uso tradicional. Ou seja, aproveitando que a porta se abriu, coloca o pé para não deixar fechar, aumentando a probabilidade de entrar, logo, aumentando a probabilidade sucesso.

Telemedicina

No caso da telemedicina no Brasil, tem sido uma constante porta fechada, por parte do CFM. Recentemente (escolho esta palavra e, de imediato, ocorre que já passou mais de um ano), parecia ter havido algum avanço, mas, a RESOLUÇÃO CFM nº 2.227/2018, Publicada no D.O.U. de 6 de fevereiro de 2019 foi revogada. Não se abriu uma porta. O CFM veio à janela, ouviu o que tinha de ouvir, decidiu da forma que entendeu, ou seja, sem fugir muito da orientação que já vinha sendo seguida.

Para quem dividiu a sua vida entre Portugal e Brasil, frases que apontam tempos de crise como tempos de oportunidade para quem quer empreender são cliché.

Mas, curiosamente, aquilo que está disponível para leitura há, pelo menos, 6 anos, sobre a necessidade de atendimento remoto para locais mais remotos (rurais, de acordo com a maior parte das publicações dos EUA, como esta e esta) ou para locais que, não ficando na periferia, são de difícil acesso (outra leitura interessante) tem sido ignorado pelo CFM e por quem tem o poder de alterar a legislação vigente e permitir o acesso da população mais carente.Sabiam que, em 2019, Portugal celebrou 20 anos de telemedicina? Na Europa e um pouco por todo o mundo, a mudança de hábitos está em plena aceleração. Não é apenas nos hábitos de convivência e socialização ou nos hábitos de trabalho, a relação com o atendimento em saúde já mudou. Em 2018, a estimativa da Comissão Europeia era de que o mercado global de telemedicina atingiria os 37 mil milhões de euros até 2021, com uma taxa de crescimento anual de 14%. Não há dúvidas, os números vão ser superados, e o vírus e o medo do contágio leva as pessoas a considerarem essas consultas mais rotineiras e tornando-as aceites. Mas, é preciso perceber que, da mesma forma que o isolamento e a quarentena já causaram problemas na velocidade da internet caseira em vários países, várias instituições de saúde nos EUA anunciaram que o elevado volume de solicitações levaram a que os sistemas ficassem sobrecarregados e, em alguns casos, indisponíveis.

Para mim, que testemunho a sede que os empreendedores brasileiros têm de acabar com o atraso tecnológico que existe em relação aos EUA, Europa ou China, é espantoso ver como o CFM consegue manter o Brasil duas décadas atrás de Portugal. Isto poderia levar à discussão dos homens-velhos-heteros-brancos que estão no poder, mas para isso seria necessário que não existissem homens-velhos-heteros-brancos associados a homens e mulheres, brancos ou não, heteros ou não, que se batem diariamente por um Brasil mais avançado. Seria suficiente para conseguir que o CFM abrisse a porta. Mas não.

Foi preciso um vírus. Uma pandemia. Foi preciso que surgisse uma calamidade que afetasse tudo e todos, para que o CFM, dia 19 de Março de 2020, encaminhasse um ofício ao ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, comunicando a decisão de “reconhecer a possibilidade e a eticidade de uso da telemedicina no País, além do que está estabelecido na Resolução CFM nº 1.643/2002, que continua em vigor. A decisão vale em caráter excepcional e enquanto durar o combate à epidemia de COVID-19”.

A COVID-19 é o pé na porta.

A pandemia é a tal oportunidade que surge da crise. (Tão bonito que isso parece quando uns estão bem e dizem isso do alto do seu bem-estar para quem está desempregado e pega na bike para fazer entregas, ou aluga um carro para “fazer uber”…)

Mas aqui é algo bem mais global. É algo que pode ter impacto significativo. Havia receio de ir contra o CFM, nem todos têm a força da Amil ou do Einstein, ou do grupo Hapvida, que informa que:

“A telemedicina já é utilizada nos atendimentos pela rede própria do Hapvida há sete anos, atendendo a cerca de 8 mil pacientes por mês nesta modalidade. A operadora conta com 24 salas equipadas com sistemas de videoconferência de alta qualidade em som e imagem, equipadas com TVs de 40 polegadas e câmeras que conseguem aumentar em 20 vezes as imagens para facilitar o diagnóstico.Todo o histórico do paciente é anotado no prontuário eletrônico à distância.”

Sete anos! Agora é uma porta que se abre e médicos e instituições de todo o Brasil vão poder colocar o pé e impedir que se feche. Tal como Uber ou 99, que operaram enquanto estados e governo federal falavam em regulamentação, a telemedicina veio para ficar.

O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que tem sido exemplar, competente e sensato no meio do desgoverno do governo, fez mais uma vez o que deveria e o Ministério da Saúde publicou no Diário Oficial regulamentando a telemedicina e permitindo a teleconsulta (médico direto ao paciente) durante o período da pandemia, permitindo prescrever e emitir atestados eletronicamente, seguindo as orientações da portaria.

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É colocar um pé na porta. Mas, para isso, é preciso que os médicos e profissionais de saúde que usam as ferramentas de telemedicina disponíveis não assumam qualquer comportamento anti-ético ou mercantilista que possa colocar em causa todos os benefícios oferecidos pelo uso da telemedicina. E é preciso que as empresas que desenvolvem ferramentas absorvam os exemplos internacionais para evitar erros de uso, criando códigos de conduta e normas de compliance que ajudem os utilizadores, e que, no caso dos SUS, percebam que é preciso uma rede forte que suporte os milhões de brasileiros que têm direito a usar, para terem atendimento de qualidade, independentemente do local onde se encontram.

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Um pé na porta (parte II)

get a/your foot in the door

to enter a business or organization at a low level, but with a chance of being more successful in the future: Making contacts can help you get a foot in the door when it comes to getting a job.

Uma das minhas expressões preferidas em inglês é esta. “Get your foot in the door”. A sua aplicação não está muito distante da tão portuguesa “está com um pé dentro”, que significa que um processo está bem encaminhado.

Para a exposição que se segue, opto por uma adaptação do uso tradicional. Ou seja, aproveitando que a porta se abriu, coloca o pé para não deixar fechar, aumentando a probabilidade de entrar, logo, aumentando a probabilidade sucesso.

Ciência

Então…estamos em tempo de crise. Pandemia. Como muitos dizem, a COVID-19 é a doença de quem viajou e ajudou o vírus a atravessar fronteiras. Enquanto a população e alguns políticos parecem interessados em discutir a origem do vírus (interesse em carimbar o passaporte do vírus que não pareceu existir com a gripe suína (H1N1) surgiu em 2009 mas que foi importante em 2003, com a gripe aviária (h5N1), a comunidade científica tenta agilizar a vacina ou, pelo menos, um tratamento para a COVID-19.

Para isso, é fundamental sequenciar o genoma do SARS-CoV-2. Na USP, conseguiram sequenciar o genoma deste novo coronavírus e isso aconteceu 48 após a confirmação do primeiro caso brasileiro de infecção. É importante notar que o resultado é fruto da cooperação entre cientistas do Instituto Adolfo Lutz do Instituto de Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da USP e da Universidade de Oxford. Esta comunicação e coordenação internacional é essencial para identificar os genomas completos do vírus SARS-CoV-2 nas diferentes localizações, perceber dispersão e mutações. Só assim se pode perceber, por exemplo, que o genoma do paciente que foi infectado na Itália – pesquisadores italianos já isolaram o vírus que circula no país, sem haver notícia da publicação do genoma para comparação – seja diferente do genoma identificado na Alemanha, mas muito semelhante ao encontrado em Espanha.

“A China sequenciou o primeiro genoma do SARS-CoV-2 logo em Janeiro, o que permitiu desenvolver de forma rápida um teste genético que indica se a pessoa está ou não infectada. Entretanto, já foram tornados públicos mais de 400 genomas de casos em quase 30 países.

Os primeiros casos positivos em Portugal foram anunciados a 2 de Março. Tinha chegado então a vez de Portugal sequenciar o genoma do vírus destes casos. “Não há obrigatoriedade [para o fazermos], mas há o pedido para que as pessoas partilhem publicamente este tipo de sequências”, refere João Paulo Gomes, responsável do Núcleo de Bioinformática do INSA.”

(in Público, 13 de março 2020)

A COVID-19 acaba por abrir a porta para quem discutia, no Brasil, em Portugal, e não só, a importância do financiamento dos setores de saúde e de educação. São os dois que podem salvar vidas. Mas, dizendo isto, é preciso perceber quantos hospitais privados e quantos laboratórios for-profit estão envolvidos nesta jornada. E quantos lavam as mãos e empurram para o estado. Afinal, qual é o plano de saúde que cobre uma pandemia?

É um pé na porta para exigir mais financiamento, mais meios e, sobretudo, valorização dos profissionais de ensino, pesquisa e da saúde.

WannaCry: o software malicioso que paralisou o NHS

O software malicioso WannaCry atacou o serviço de saúde da Grã-Bretanha e empresas na Espanha, Rússia, Ucrânia e Taiwan, sequestrando dados e exigindo um resgate para liberar. Este tipo de software, de nome ransomware (de ransom: resgate) usa uma vulnerabilidade revelada pela primeira vez ao público devido a documentos que foram vazados relacionados a NSA, com a finalidade de infectar computadores com o sistema Windows e criptografar seu conteúdo, exigindo pagamentos de centenas de dólares em troca da chave para descriptografar arquivos.

O ataque coordenado conseguiu infectar um grande número de computadores em todo o serviço de saúde britânico em menos de seis horas após ser detectado pela primeira vez por pesquisadores de segurança, o que revela sua capacidade de se espalhar em redes de PC para PC. Hospitais em toda a Inglaterra foram obrigados a desviar pacientes de emergência devido ao WannaCry.

Quando um computador é infectado, o ransomware costuma entrar em contato com um servidor central para obter as informações necessárias para ativá-lo e, em seguida, começa a criptografar arquivos no computador infectado com essas informações. Após criptografar todos os arquivos, ele envia uma mensagem solicitando o pagamento para descriptografar os arquivos — e ameaça destruir as informações se ele não for pago. O efeito dramático é dado frequentemente através de um temporizador.Para evitar este tipo de ataque, é preciso saber como não abrir a porta ao ransomware. A maioria dos ransomware está escondida dentro de documentos do Word, PDFs e outros arquivos normalmente enviados via e-mail, ou através de uma infecção secundária em computadores já afetados por vírus que oferecem uma porta traseira para novos ataques. Basta que um usuário inconscientemente instale este ransomware em seu próprio PC, para que ele tente se espalhar para outros computadores na mesma rede. Para isso, usa uma vulnerabilidade conhecida no sistema operacional Windows, saltando entre PC e PC. Essa fraqueza foi revelada ao mundo como parte de um enorme vazamento de ferramentas de hacking da NSA e fraquezas conhecidas por um grupo anônimo chamado “Shadow Brokers” em abril.

O WannaCry, que afetou a Telefónica na Espanha e o NHS na Grã-Bretanha, é o mesmo software: um pedaço de ransomware. Em menos de quatro horas já tinha infectado computadores apenas em Lancashire, de onde terá se espalhado para toda a rede interna do NHS. O valor pedido é de 300 libras, a ser pago em Bitcoin, para desbloquear o conteúdo dos computadores.

Ransomware WannaCry atacou grandes empresas multinacionais de diversos setores

Mas, será que pagar o resgate realmente desbloqueia os arquivos? Talvez. Nem sempre funciona.O ransomware de Cryptolocker que atacou há alguns anos e exigia um resgate em torno de £ 300, terá cumprido a devolução após receber o pagamento, mas, lembram especialistas em cibersegurança, citados pelo The Guardian, “não há garantia de pagamento vai funcionar, porque os cibercriminosos não são exatamente o grupo mais confiável de pessoas”. Além disso, lembram, há a questão ética: pagar o resgate pode fomentar mais crimes. A solução mais prática é efetuar um backup dos arquivos.Por que o NHS está sendo direcionado?

Segundo a imprensa britânica, o NHS foi uma vítima fácil, pois ainda usa Windows XP, um software antigo, que não recebeu atualizações de segurança disponíveis há meia década, sendo esse o motivo para o ataque. Mas, atualmente ataques em provedores de cuidados de saúde em todo o mundo estão em um máximo de todos os tempos. As informações privadas, incluindo registros de saúde, são extremamente valiosas, tornando-se um alvo apetecível dos cibercriminosos.

Publicado originalmente no portal DiagnósticoWeb
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Publicado em HunHU

Shafi Ahmed quer acabar com escassez global de cirurgiões

A Comissão do Lancet sobre Cirurgia Global divulgou um relatório em 2015 afirmando que cerca de cinco bilhões de pessoas em todo o mundo não têm acesso a cirurgia segura. Shafi Ahmed está tentando mudar isso. Ele ensina cirurgiões em todo o mundo usando tecnologia ou se deslocando até escolas de medicina em diferentes países.

Shafi é cirurgião laparoscópico no Royal London and St Bartholomew’s Hospitals, educador e professor, inovador, empreendedor e evangelista de realidade aumentada e virtual (RA e RV). Um futurista que é o decano associado do Bart’s Royal London Hospital, o maior hospital da Europa ocidental e um dos hospitais mais antigos do mundo, fundado em 1123. Curiosidade: foi o lugar onde Sherlock Holmes e Dr. Watson se encontraram pela primeira vez. E se Sherlock tinha sua lupa, Shafi tem Google Glass, Google Cardboard, Snapchat Spectacles e está aberto para tentar todos os tipos de tecnologia que ajudem a compartilhar seu conhecimento e suas experiências.

Em 2014, usando o Google Glass, ele removeu um câncer de fígado sob o olhar distante de 13.000 estudantes de 113 países, que enviavam perguntas a Ahmed e iam surgindo na lente do seu Glass. Ele leu e respondeu no mesmo instante, falando como se estivessem ao lado dele.

A escassez global publicada no relatório de 2015 obriga a que milhões de cirurgiões, anestesistas e obstetras sejam treinados durante a próxima década. Medical Realities, a empresa que Shafi Ahmed fundou em 2015, juntamente com Steve Dann, lançou sua plataforma esta semana e permitirá que Ahmed ensine remotamente usando streaming de 360 graus.

Shafi Ahmed aceitou o meu pedido de entrevista um dia depois do lançamento da plataforma Medical Realities revelou um pouco sobre esse projeto e seus planos futuros.

Ontem você lançou sua plataforma Medical Realities. Qual a importância desta realização?

Shafi Ahmed — Basicamente, é uma grande conquista. Vem mudar a educação para sempre. Esta é uma nova forma, um novo paradigma de aprendizagem. O que fizemos com a nossa plataforma RV é mudar a forma como as pessoas podem ser ensinadas e podem aprender no futuro, não apenas em medicina, mas todas as áreas. As pessoas ainda estão descobrindo o que significa RV e vídeo 360. Você assiste ao vídeo, olha ao redor, é imersivo. Você junta animação CGI. Como uma empresa, passamos 9 meses a trabalhar com 20 desenvolvedores, clínicos e animadores CGI, etc. O que RV significa? Hackear e criar aprendizagem neste ambiente. Passamos muito tempo pensando no valor e na validação desse sistema. Agora que lançamos, todo mundo que viu e entende onde a RV pode ser benéfica. Antes de ontem, ninguém sabia onde a RV ia, não havia nenhum conteúdo. É hardware, é um pouco de software. Criamos uma forma para que outros possam agora criar conteúdo que vai ser valioso. Acho que é uma grande mudança, uma mudança completa de direção da aprendizagem futura. É formidável! Falei com a minha equipe hoje para felicitar cada um por mudar todo o paradigma de aprendizagem.

Como funciona essa transmissão ao vivo?

SA — Tenho uma equipe e nós temos um equipamento montado por cima do paciente no teatro cirúrgico para podemos gravar. Isso transmite ao vivo para qualquer dispositivo ou smartphone. Você pode assistir ao que está acontecendo no teatro de operações em tempo real em dispositivo RV, ao vivo. É assim que funciona.

Quando pensamos em gravar uma operação ao vivo, pensamos nos problemas que, por todo o mundo, se coloca à telemedicina, em termos de privacidade e questões legais. Você encontrou algum e, caso tenha encontrado, como você conseguiu ultrapassar?

SA — Primeiro que tudo, o hospital onde trabalho, o Royal London Hospital, que faz parte do Barts Health Trust, todos têm sido muito solidários. O meu hospital é o maior hospital da Europa Ocidental. É enorme. É um dos hospitais mais antigos do mundo, com mil anos de idade. Estamos levando esta instituição numa viagem em inovação. E, ao invés de dizerem “não, há muitos problemas”, perguntaram “como podemos fazê-lo funcionar? O que você precisa para fazer o trabalho?”. Então, nós olhamos para a ética, a privacidade / confidencialidade, pensamos sobre o quadro legal, e todas essas coisas. O que fazemos é inovar e cuidar da parte ética e legal ao mesmo tempo, ao invés de pensar um a um e questionar como podemos fazer isso funcionar. Acredito que muitas perguntas sobre privacidade e confidencialidade não foram realmente respondidas, estamos muito atrás da tecnologia, certo? Nós sabemos isso. Se você fizer as perguntas certas, você obterá as respostas. Nossos pacientes são realmente solidários, eles dão consentimento explícito para fazer uma operação ao vivo em todo o mundo e para a transmitir. Eles são muito solidários e isso faz a diferença. Assim, o quadro legal suporta isso. Se você é claro, franco, honesto e os pacientes dão consentimento explícito, não há qualquer problema. No início, atrasávamos a operação em 30 segundos para prevenir casos de grandes catástrofes ou complicações, mas já fizemos tantas operações transmitidas, que agora que eles não se incomodam, é apenas uma questão de entender que as câmeras estão ao seu redor e a equipe trabalha no ambiente. Apenas é necessário certifique que, quando começamos a transmissão, tudo deve parecer profissional e a equipe deve estar trabalhando bem, para que público assistindo considere que é uma experiência de aprendizagem boa e muito profissional. É isso que estamos tentando mostrar.

Muitas das operações são sobre pacientes com câncer. Quão grande é isso em oncologia?

SA — Eu sou especialista em câncer, por isso, os meus pacientes têm diagnóstico de câncer. Penso que o câncer é universal, todos entendem o câncer em todo o mundo, o tratamento é padrão. Quando os pacientes têm câncer e concordam em ter uma operação transmitida ao vivo, é algo muito emocional que eles estão dando. Todos percebem isso e é algo que prende a imaginação. Mas, é apenas a minha área, quero dizer, se eu estivesse fazendo outra especialidade, seria outra coisa. Acontece que eu sou especialista em câncer e meus pacientes têm câncer que requer cirurgia e eles são solidários.

Você atua apenas na escala virtual onde as pessoas podem assistir o que você está fazendo. Viaja e vai a vários hospitais em todo o mundo, ensinando pessoalmente…

SA — Levo o meu trabalho até muitos países: Bangladesh, Paquistão, Índia, Sri Lanka, Egito, Palestina, no Oriente Médio, África, vários lugares. Apenas mostra que muito do meu interesse é sobre educação global, saúde global, como democratizar a educação, como ampliá-la e como usar essas tecnologias para capacitar as pessoas ao redor do globo, como tornar mais fácil, como fazer tornar a saúde mais equitativa. E como treinar não apenas um cirurgião, não dois cirurgiões, mas milhares de cada vez, e compartilhar esse conhecimento.

O próximo passo é o paciente virtual. Você realmente quer operar em um corpo virtual, correto? Quão longe ou perto você está para chegar a esse ponto?

SA — Um longo caminho. O que estamos tentando criar, em primeiro lugar, no mundo virtual é um paciente virtual com avatar de real, imagiologia CGI, para parecer realista na sua frente, em ambiente virtual. Depois, é preciso introduzir todos os órgãos, só então você será capaz de operar naquele paciente virtual. Isso exige algum feedback de sensibilidade ao toque, ser capaz de sentir, ser capaz de operar. O processo todo levaria provavelmente cerca de 2 a 5 anos, talvez um par de anos para chegar no ponto em que você pode fazer algo em um paciente virtual.

Sua primeira operação usando Google Glass foi em 2014. O que mudou desde a primeira experiência até à mais recente?

SA — Acho que a primeira experiência foi mesmo experimentar com novas tecnologias e foi um teste sobre se poderíamos fazer isso. Era novo, era talvez um pouco desconhecido. Naquele dia, nós ensinamos 14 mil alunos em todo o mundo usando Google Glass. Desde então RA (Realidade Aumentada), que é o que o Google Glass é, mudou para RV (Realidade Virtual). VR entrou, é novo, é mais diferente, é mais imersiva. E acho que com essa experiência de viver operando e ensinando ao redor do globo, temos uma grande plataforma e acredito que temos reconhecimento mundial. Muitas coisas mudaram, incluindo a aceitação, a compreensão das pessoas, e a RV permite diferentes tipos de experiência de aprendizado. Acho que seguimos em frente e amadurecemos com essa experiência.

Cirurgião do Royal London Hospital lançou plataforma de Realidade Virtual para ensino da medicina, Medical Realities.

Nessa ocasião, muitas pessoas na China estavam assistindo de seus desktops, algumas pessoas em outros países estavam usando seus óculos ou smartphones … você sabe quantas pessoas estavam assistindo?

SA — Vou lhe contar essa história. O que aconteceu foi que, quando estávamos fazendo a operação RV no passado mês de abril de 2016, meia hora antes da operação recebemos uma ligação da maior rede emissora de TV da China dizendo “soubemos do que você está fazendo, nós amamos a ideia, queremos o feed para transmitir para 1,2 bilhão de chineses”. Então nós pensamos “o que vamos fazer?”. Como tínhamos apenas uma certa largura de banda, tínhamos apenas alguma capacidade de armazenamento em nossos servidores e dissemos “ok, não temos certeza do que vai acontecer, mas não queremos sobrecarregar o servidor inteiro e travar tudo”. Então, nós aumentamos o volume para 200 mil, mas o que eles fizeram na verdade foi tirar o feed de nossos servidores para os próprios servidores na China. Portanto, não temos noção de quantas pessoas estavam sintonizadas. Podem ter sido centenas de milhares. Não fazemos ideia.

Essa não foi a sua última operação transmitida …

SA — Não. A última grande foi o Snapchat que eu fiz em novembro usando Snapchat Spectacles. Essa foi o última em termos de transmissão global.

Ou seja, você está tentando diferentes plataformas. Você diria que você vai tentar todas elas ou vai se concentrar em apenas uma?

SA — Google Glass foi ótimo quando saiu. Ótimo dispositivo, transmissão ao vivo, fácil de usar na sua cabeça, dispositivo de luz, computador muito poderoso, e você pode pessoas de texto em seu telefone, podemos ver as mensagem na tela e a interação é agradável. RV significa menos interação para você, interação para todos os outros, porque eles estão imersos no mundo RV. É de alta fidelidade, mas de baixo custo com seu smartphone, seu aplicativo e seu Google Cardboard. Snapchat foi outra experiência. Se você olhar para meus alunos em todo o mundo, há cerca de 150 milhões de usuários Snapchat ativos diariamente. Acho que é a plataforma de Realidade Aumentada mais poderosa que está lá fora. É a maior. Nós não pensamos nisso como Realidade Aumentada, mas é uma plataforma de realidade aumentada. Veja que 75% dos usuários estão entre as idades de 17 e 25 anos. Se você olhar para os meus estudantes de medicina, é a idade deles. Eles usam essas redes sociais. As redes sociais, para mim, são uma maneira de acessar as pessoas. Todo mundo tem um APP gratuito em seu celular, um clique pode acessar milhões de pessoas, se você quiser. Facilidade de acesso, conectando mentes humanas, correto? Quando eu usei Snapchat Spectacles, tinha acabado de ser lançado, permitindo que você grave em clipes de 10 segundos. A minha questão era se dava para ensinar as pessoas em segmentos de 10 segundos. Temos que pensar sobre o que estamos tentando dizer, gravar, e publicar em 10 segundos. É curto, é nítido e faz sentido. Então, foi uma experiência para ver se isso seria capaz de capacitar as pessoas. Apesar de algumas dúvidas quanto ao uso de redes sociais, nós fomos vistos por 2 milhões de pessoas, e tivemos mais de 100 mil downloads no youtube. Recebi todas as revistas e jornais do mundo, apenas com base nos simples Snapchat Spectacles e clipes de 10 segundos. Revistas de todo o mundo cobriram, incluindo a revista Time, até mesmo a Cosmopolitan, o que é realmente incrível! Disruptivo!

SA — Eu estive assistindo a uma de suas cirurgias no Facebook Live e eu não sou um grande fã de sangue …

SA — Você viu isso! No Bangladesh! O Facebook, lembre, tem 2 bilhões de usuários ativos diariamente. Isso é um terço da população mundial. Se você quiser acessar seres humanos, treiná-los e fornecer conhecimento, você está lá: um clique no Facebook e você acessa o mundo inteiro. Isso é o que eu estava tentando mostrar. No Bangladesh, fiz uma operação ao vivo no Facebook e 10 mil alunos sintonizaram imediatamente. Imediatamente! Você está acessando pessoas e ensinando em todo o mundo. E essa é a beleza das plataformas de rede social. E eu acho que não estamos usando da forma correta. Você pode tirar fotos de seu gato, seu cachorro, sua comida e sua viagem e isso é ótimo. Mas há algo mais poderoso por trás dessa mensagem e é sobre conectar pessoas e compartilhar seus conhecimentos. Você tem conhecimento, eu tenho conhecimento, queremos compartilhar esse conhecimento. Então, nós compartilhamos com uma ou duas pessoas, nos sentimos empoderados, por estarmos compartilhando o que aprendemos nessa troca de experiências. Mas por que não compartilhar conhecimento com dezenas de milhares de pessoas? Isso tem muito mais impacto. E deixa um legado. Essa é a minha opinião.

Mais do que apenas educar, você está permitindo que famílias e futuros pacientes assistam à cirurgia. Qual a importância para alguém que vai ter uma cirurgia ou que tem um ente querido sendo operado?

SA — Uma das coisas sobre a cirurgia que estamos tentando mudar é desmistificar a cirurgia. Eu sei que as cirurgias são um pouco secretas, você tem a máscara, você está no teatro de operações, ninguém sabe o que está acontecendo. Há uma certa carga mística sobre a cirurgia, que nós compartilhamos. Eu acho que nós mantemos isso assim de propósito para que as pessoas não entendam o que fazemos. Acho que quando fazemos isso, ser claros, ser transparentes, levar as pessoas para a sala de operações, isso é o que fazemos, isso é quem somos, somos seres humanos, ajudamos as pessoas, a equipe ao seu redor está trabalhando. É bom para mostrar esse todo esse lado da cirurgia, para que as pessoas aí entendam. Há uma história que quero compartilhar com você. Quando fiz uma operação transmitida ao vivo em realidade virtual no ano passado, terminei a operação, que foi uma operação de câncer e saí da sala de operações. Havia muitas câmaras de televisão, que eu fui afastando, até chegar ao outro extremo do corredor. Encontrei a esposa e os filhos do paciente que eu tinha operado. Então eu perguntei como estavam, como se sentiam. E eles responderam “Muito obrigado, Sr. Ahmed, assistimos à operação ao vivo. Obrigado”. Meu queixo caiu. Caiu, não estou brincando. Eu não sabia o que dizer. Era a última coisa que pensava ouvir. Confessei que não imaginava que estivessem assistindo. E a resposta muito interessante. “Isso nos ajudou. Porque normalmente quando seu ente querido vai para uma operação, você vai tomar um café durante 3 ou 4 horas, fica andando inquieto para cima e para baixo, está ansioso e tudo mais. Nesta ocasião, estávamos assistindo a operação ao vivo, podíamos ver o que você estava fazendo e fomos tranquilizados pois ele estava em boas mãos e as coisas estavam indo bem. Estávamos mais felizes”. Eu não esperava isso de forma alguma. Como não fizemos a pergunta, não obtivemos as respostas. Assumimos que os pacientes querem coisas diferentes. Basta perguntar aos pacientes: “o que você gostaria? Como você gostaria de ser tratado? Você quer assistir a sua operação?” E, na verdade, as respostas podem ser mais surpreendentes do que imaginamos.

Publicado originalmente no portal DiagnósticoWeb
Publicado em HunHu

6 dicas para driblar a crise na saúde brasileira

Todos os indicadores levam o Brasil a procurar soluções para o cenário de crise que atravessa e que deverá se agravar. Os diversos setores buscam otimizar recursos e diminuir despesas, criar novos modelos de gestão e equilibrar a contabilidade para encarar a tempestade econômica brasileira.

As instituições de saúde tentam se organizar e procuram quem as possa auxiliar. Antônio Carlos Kronemberger, Diretor Acadêmico e de Soluções Corporativas e EAD do Grupo Ibmec, é co-autor do livro “Marketing em Organizações de Saúde” e dá seis dicas para conseguir driblar a crise numa área responsável por quase 10% do PIB nacional. O setor de saúde no Brasil registra uma inflação anual de 18%, o que traduz uma considerável falha entre custos e preços. Exigem-se soluções, são necessárias para não cair no buraco da crise que parece querer engolir a economia brasileira e levar a saúde e suas instituições junto.

Numa lista de importantes dicas, a luz ao fundo do túnel pode ser surgir através de aprimorar a alocação de recursos humanos ou dotar de mais eficácia o tipo de serviços prestados serão preciosas ajudas na hora de superar os desafios que se avizinham.

1.Olhar com muita atenção o sistema de custeio e entender corretamente o negócio

O objetivo é fim de reduzir o gap entre custos que aumentam mais do que os preços, destruindo valor (a inflação médica este ano está em 18%). O que acontece é que os custos aumentaram muito, em função, em grande parte, da tecnologia ser “dolarizada” e o mercado não consegue absorver esse aumento de custos nos preços. É necessário olhar para dentro e ver de que maneira pode se trabalhar esses custos para reduzir esse gap.

A administração da farmácia, chamada farmácia central, que normalmente tem diversos remédios escolhidos por cada médico, deverá ter um número reduzido de remédios de diferentes marcas de um determinado princípio ativo. Dessa forma o hospital tem maior capacidade de negociação junto do fornecedor, tanto para remédios como para insumos, pedindo maior número de um determinado produto de certa marca.

A dose única é um outro exemplo. Por meio de tecnologia, consegue fazer com que a enfermeira vá uma vez só por dia no apartamento ou quarto do paciente e coloque lá todos os medicamentos daquele dia, com o respectivo horário.

2. Alterar o modelo de pagamento dos prestadores de serviço

Mudando o modelo de pagamento com base em atendimento para pagamento por serviço com sucesso/resolução do problema ou fazendo um mix entre os dois modelos. Hoje em dia, o prestador é pago por atendimento. Através do plano de saúde, o paciente vai no médico ou na fisioterapia e são atendidas quatro pessoas em uma hora, pois é pago por atendimento. Se passar a remunerar isso pelo êxito ou pelo mix entre êxito e atendimento, certamente esse atendimento vai ter uma quantidade menor e melhor. Com isto, melhora a resolutividade como reduz custos. É uma operação que agrega valor para toda a cadeia, para o paciente, para o médico e para a operadora.

3. Montar a solução em função do usuário ou paciente e não focar apenas nos recursos disponíveis.

Atualmente as soluções dos problemas são oferecidas de forma isolada e com foco apenas nos recursos disponíveis, quando, na verdade, deveriam ser de forma integrada, sempre com foco no paciente. Por exemplo, quando você vai no médico com dor de cabeça. O médico diz que a causa é um problema de visão e encaminha para um oculista. Você escolhe um oculista, marca a consulta e o oculista analisa e fala que o problema é na retina. Então você vai para um especialista de retina. O especialista de retina diz que você precisa de uma cirurgia, então você tem que procurar um cirurgião. É necessário focar nos recursos disponíveis. Se você efetivamente no primeiro atendimento já consegue encaminhar diretamente, o resultado vai ser mais rápido, melhor e menos custoso, com uma percepção de valor muito maior.

4. Buscar o equilíbrio entre pessoas, tecnologias e processos.

A partir do diagnóstico correto da necessidade, a solução deve ser oferecida por meio do balanceamento entre pessoas (competências), tecnologias e processos. Se for algo simples como, por exemplo, alguém que quebrou um dedo. É um atendimento relativamente simples, baseado em protocolo de atendimento. A pessoa tem que fazer uma radiografia e engessa o dedo a partir do diagnóstico do médico, é algo bem processual. Nesse caso tem mais processo do que tecnologia. Num segundo caso, você precisa de um diagnóstico mais profundo, vai fazer um exame de imagem tridimensional, algo que requer mais tecnologia. Existe um técnico que opera a máquina, estamos falando de um aparelho que custa centenas de milhares de dólares, operada por uma pessoa com um salário de 2 mil reais. Agora, se você vai para uma cirurgia de alta complexidade, é muito mais na competência da equipe médica do que em tecnologia ou processos. É preciso fazer uma seleção, decidir o que é mais focado em tecnologia, o que necessita mais de processos ou o que requer mais competências.

5. Segmentar o tipo de atendimento.

Esta dica complementa a anterior. O atendimento deve ser segmentado com base no usuário, baixa, média ou alta complexidade, por especialidade ou por outro critério que faça sentido e seja relevante. Se você faz o levantamento do tipo de atendimento, isso permite selecionar naturalmente o tipo de assistência, criar uma otimização e direcionar de forma eficaz o paciente, poupando tempo e recursos.

6. Focar mais na prevenção e promoção de saúde do que nos tratamentos.

Partindo do velho ditado “é melhor prevenir do que remediar”, sai muito mais barato acompanhar o paciente que sofre de pressão alta, estimular para que faça exercício e tenham uma alimentação regrada, do que depois suportar o internamento. Apostar na educação das pessoas para que sigam um estilo de vida saudável e dessa forma não necessitem, por exemplo, de internamento. Olhando para o caso da AMIL, ela percebeu que 5% dos seus segurados correspondia a 35% dos seus custos. Esses 5% correspondiam a doenças crônicas, diabetes, hipertensos, que necessitam ir regularmente ao hospital e requerem tratamentos constantes, então, ela criou um produto que corresponde a um atendimento diferenciado, na sua rede própria e tem uma abordagem preventiva. Essa solução representa uma redução importante nos seus custos.

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Publicado na Revista Diagnóstico

Arlen Meyers “Hospitais liderados por médicos são mais lucrativos”

Para o CEO da SoPE — Sociedade de Médicos Empreendedores (Society of Physician Entrepreneurs) –, médicos têm cada vez mais a oportunidade de descobrir que aprender a fazer negócios é tão importante quanto se aprofundar na prática clínica.

A velha máxima de que o médico é um péssimo empresário não passa de um mito perpetuado por consultorias que, claramente, querem lucrar com essa linha de pensamento. A frase polêmica é do médico americano Arlen Meyers, CEO da SoPE — Society of Physician Entrepreneurs (Sociedade de Médicos Empreendedores, em tradução livre) –, com sede no estado da Connecticut, costa leste americana. Meyers, que continua exercendo a profissão, apesar de dedicar grande parte do seu tempo à consultorias e à docência, defende categoricamente que um sem fim de médicos mundo afora são muito proficientes no exercício do empreendedorismo. “Hospitais liderados por médicos são mais lucrativos e têm melhores resultados financeiros do que aqueles dirigidos por quem não é médico”, garante o dirigente. “O contrário disso é um mito disseminado, em larga medida, por consultorias interessadas em vender seus serviços”. Mas há um aliado nesse processo de “desinformação”, acredita ele: as faculdades de medicina, que formam mal seus estudantes e “enterram cada vez mais a cabeça na areia”, quando assunto é o estímulo ao empreendedorismo. Para Meyers, o “Negócio Saúde” e as novas tecnologias deveriam ser parte da educação de todo estudante de medicina. “É negligente toda faculdade de medicina que não prepara os futuros médicos para as novas ferramentas tecnológicas e para os desafios de gestão na área da medicina”, provoca o docente, para quem as grandes corporações de tecnologia global, a exemplo da Google, Apple e IBM vão ter um peso cada vez mais influente na forma de se fazer a medicina moderna. Mas como será esse futuro médico, misto de aconselhador, detentor da técnica e de um olhar mais “digital”? “Serão profissionais que não irão tratar os pacientes, mas cuidar também de toda a informação fornecida pelos pacientes”, descreve Meyers, em tom professoral. “Esse, aliás, passará a ser um ponto de dados. E o médico, em grande medida, o gestor dessas informações”.

“Encontrei” Meyers na cidade de Denver, bem no coração do Colorado. Às 10h da manhã — horário local –, ele atendeu para falar sobre o futuro da medicina, inovação, tecnologia e empreendedorismo.

Médicos lideram os cinco melhores hospitais dos Estados Unidos, segundo a AAPL (American Association of Physician Liaisons). A expertise clínica conta pontos para o gestor da área da saúde?

Arlen Meyers — Hospitais liderados por médicos são mais lucrativos e têm melhores resultados financeiros do que aqueles dirigidos por quem não é médico. Estamos falando de grandes sistemas hospitalares. Minha experiência diz que entregar aos médicos a missão ou visão do hospital pode ser mais fácil se ele tiver a mentalidade de um líder munido de cultura e entendimento dos detalhes do sistema. É como se um de nós estivesse liderando uma organização depois de já ter estado lá, sabendo como tudo funciona. Parte desse mérito tem a ver, obviamente, com a credibilidade clínica. Fundamentalmente, médicos olham para seus líderes assistenciais por sua credibilidade, mas não fazem o mesmo paralelo na área administrativa.

Existe a ideia de que um médico gestor só pode assumir uma destas funções: ou lidera ou se dedica à assistência. Como quebrar essa linha de pensamento?

Meyers — Em primeiro lugar, é importante definir os termos. Basicamente, estamos falando de médicos que são técnicos e estão na linha da frente tratando pessoas. Em algum momento da carreira, esses profissionais evoluem para a função gerencial, o que os obriga naturalmente a saber otimizar recursos para obter o máximo de eficácia. No passo seguinte, se tornam líderes, conduzindo a visão, direção e inspiração do negócio. O nível acima desse é o do empreendedor, que cria valor e o transfere aos stakeholders. Acho que os médicos têm capacidade plena de seguir essa trajetória. E podem exercer todas as funções concomitantemente ao exercício da medicina. Porém, apenas um número muito reduzido é capaz disso. Quando falamos da evolução ao papel de empreendedor, o número de médicos com essa mentalidade é extremamente limitado, inclusive o de líderes empreendedores. Encontrar um médico que seja líder e tenha mentalidade empreendedora é raríssimo.

Acha que as faculdades de medicina podem contribuir com esse processo?

Meyers — Existe uma lógica segundo a qual todos temos algo que faz parte de nossa natureza e algo que é desenvolvido ao longo da vida. Em parte, ter uma mentalidade empreendedora é um traço de personalidade. Por essa perspectiva, a resposta é não: ou a pessoa tem essas características ou não tem. Por outro lado, alguns indivíduos possuem essas características, só que não completamente desenvolvidas. Para eles, claro, podemos criar um ambiente propício ao desenvolvimento dessas qualidades.

O que dizer aos defensores da tese de que a faculdade de medicina não é lugar de ensinar a fazer negócios?

Meyers — Praticamente nenhuma faculdade de medicina ensina a fazer negócios. Do meu ponto de vista, isso é negligência educacional. O ambiente na área da saúde é tão complexo e mutante que eu não diria que aprender a prática de medicina é mais importante do que aprender sobre o “business da saúde”. Diria que é algo que deveria fazer parte da educação de todo estudante de medicina, mesmo na fase de residência médica. Ao não fazer isso, as faculdades de medicina estão enterrando a cabeça na areia na esperança de que o problema desapareça. Quando muito, a tendência é a de que vá piorar.

Os cursos de medicina precisam diversificar as matérias da grade tradicional ou o ensino de negócios deve ser complementar, tratado na pós-graduação?

Meyers — A maioria dos profissionais do ensino de medicina já reconhece que o sistema não está proporcionando aos alunos as competências de que necessitam para serem bem-sucedidos e cuidarem de suas respectivas comunidades. As pessoas estão tentando entender como redefinir e alterar os programas para dar aos estudantes conhecimentos, competências e habilitações que garantam um aprendizado satisfatório. A meu ver, é necessário incluir saúde digital na grade curricular, assim como as ferramentas de gestão empresarial e empreendedorismo na medicina. Mas não a um extremo em que se desloque o cerne do conhecimento médico científico, que é um requisito indispensável para se cuidar do paciente. No entanto, ignorar totalmente novas vertentes na dinâmica da formação médica é uma irresponsabilidade. Creio que mais estudantes estão chegando à faculdade com a ideia de que não querem exercer a medicina por 40 anos — e alguns sequer querem ser médicos. Se abrirmos o processo de admissão a pessoas que não têm a menor intenção de exercer a medicina e querem um MBA para terem credibilidade clínica, essas pessoas estarão apenas interessadas em criar uma empresa ou montar um negócio na área da saúde. A vida clínica média, isto é, o número de anos em que os médicos exercem a profissão, acredito, será mais curta. Estudantes de medicina saltarão entre diferentes carreiras ou mesmo entre empregos, e mais médicos vão querer clinicar em tempo parcial. O fato é que nós, como academia, não estamos providenciando a plataforma que esses estudantes necessitam para atingir seus objetivos. E precisamos fazer isso, logo. Caso contrário, veremos cada vez mais insatisfação nos médicos, assim como depressão, esgotamento e até suicídio. Nós não estamos nos adaptando às necessidades do mercado.

Arlen Meyers, em São Paulo, 2016

Há anos existe um consenso de que um executivo hospitalar deve vir do mercado, pois o médico enfatiza demais a excelência técnica e, por isso, abre mão do controle de custos. Concorda com essa visão?

Meyers — Existe um mito de que os médicos são péssimos nos negócios. Isso é absolutamente falso. Em primeiro lugar, é preciso detalhar o que significa ser péssimo para negócios. Seria não saber ganhar dinheiro? O que é um péssimo investidor? Talvez aquele que não saiba como dirigir uma organização. Pessoalmente, lido com diversos médicos que são muito proficientes como empresários. Por isso, acho que existe um mito generalizado de que médicos são péssimos empresários. Isso, de certa forma, é conveniente para os prestadores de serviços que pretendem providenciar aconselhamento financeiro, pois enxergam nesses profissionais um alvo fácil. Discordo absolutamente dessa afirmação, que revela falta de visão. Francamente, considero-a insultuosa.

O que você acha da convivência entre médicos e não-médicos no conselho dos hospitais? É possível conviver com modelos híbridos?

Meyers — Isso é essencial para a bioinovação e o empreendedorismo. Faço parte de diversos comitês consultivos e conselhos de administração, trabalho com pessoal não-médico, técnicos, empresários, engenheiros, e acredito que quanto mais diversificado for o grupo, mais criativo será. Ter um médico no conselho é crucial para dar uma perspectiva clínica ou um melhor entendimento de uma questão clínica, seja em uma diretoria hospitalar ou em uma diretoria de empresa ligada à indústria. Na verdade, muitos dos problemas que estamos vendo na área da saúde digital são consequência de uma falha dos fornecedores, que não envolveram adequadamente os consumidores finais no processo de desenvolvimento dos novos produtos — e isso inclui pacientes e médicos.

O médico Robert Pearl disse em artigo recente que a maioria das startups da área de tecnologia da informação para a saúde tem uma falha embrionária: seus produtos são formados quase sempre por profissionais de informática, com escassa participação de médico, seja como desenvolvedores ou consultores. Por que isso ocorre?

Meyers — Porque essas startups são impulsionadas pelo retorno do investimento, e não pela eficácia clínica. A maioria dos produtos e serviços de saúde digital é criada e desenvolvida fundamentalmente graças a investidores e empreendedores de base tecnológica cujo objetivo é fazer a empresa crescer em escala o mais rapidamente possível. Francamente, eles não estão interessados em segurança dos dados, em segurança de tecnologia da informação para a saúde, e certamente, tampouco em eficácia clínica. A maioria dos produtos criados tem pouco ou nada a ver com o objetivo de trazer melhoria aos pacientes, e sim como ampliar o retorno e gerar cada vez mais lucro.

A entrada de gigantes tecnológicos como Google, Apple e Microsoft continuará a dar o tom sobre o futuro da medicina?

Meyers — Claramente. O futuro dos cuidados em saúde é migrar para tecnologias de interface, como comunicação social e de massa, telecomunicação e Big Data. Tanto a assistência quanto a gestão estão se tornando cada vez mais digitais. Portanto, para todos os efeitos, uma das megatendências é olhar para os pacientes como pontos de dados e para os médicos como gestores de dados. A interface entre ambos serão profissionais de dados e empresas especializadas em adquirir, analisar e distribuir essas informações. Estamos falando de empresas de telecomunicações, de conteúdo, de comunicação social. No futuro, os grandes players do setor de saúde não estarão necessariamente em hospitais, mas em áreas como telecomunicação, aeroespacial, Big Data e tecnologia. Veremos cada vez mais interfaces entre farmacêuticas, dispositivos, prestação de serviços de cuidados de saúde e essas tecnologias. Um exemplo é a Teva, de Israel, que fez um grande investimento em telemedicina. Eles não estão fazendo isso por acharem que é uma boa ideia e sim para expandir seu negócio e por acharem que essa é uma área em crescimento. Será cada vez mais difícil distinguir o que é tecnologia e o que é medicina. Teremos uma fronteira cada vez mais borrada. Acho que, no futuro, as Apples, os Googles e as Samsungs vão liderar a saúde em nível global.

Mesmo com as limitações impostas à telemedicina?

Meyers — Acredito que sim, apesar do desafio ser grande. Afinal, usar essas tecnologias em larga escala depende muito do ecossistema e de restrições regulamentares e legais. Há resistência principalmente com relação a reembolsos, licenciamento, credenciamento, pagamento e, também, com fatores humanos. Existem inúmeras barreiras à adoção e ao uso generalizado da telemedicina nas áreas rurais, por exemplo. Isso não é um problema exclusivo dos Estados Unidos. Países igualmente continentais como Brasil, China e Índia não conseguiram implementar projetos de medicina em larga escala de forma efetiva. O problema, nesse caso específico, está relacionado com infraestrutura, dinheiro, modelo de negócio e restrições regulamentares e legais.

A questão é discutida nos EUA desde o final da década de 50…

Meyers — A primeira patente de telemedicina, e sua primeira aplicação, aconteceu em meados da década de 1920. Ou seja, estamos quase celebrando cem anos da primeira utilização da telemedicina. Mudar qualquer sistema de saúde leva uma eternidade. Na América do Norte, você tem razão, o debate remonda os anos 50. Só muito recentemente, pelo menos nos Estados Unidos, os conselhos estaduais de medicina, legisladores estaduais e as autoridades federais começaram a remover algumas das barreiras para a implementação da telemedicina. Essas questões têm a ver com economia, política e diferenças regionais e culturais. A tecnologia existe há muito tempo e nunca foi o problema. O problema parte das pessoas e dos sistemas políticos e econômicos, que são os verdadeiros obstáculos.

Os médicos devem se adaptar a essas tecnologias ou é a tecnologia que deve ser desenvolvida para os médicos?

Meyers — Acho que deve haver um pouco de ambos. O propósito da tecnologia no setor da saúde é ajudar os médicos a cuidar dos pacientes ou ajudar os pacientes a cuidarem deles mesmos. Portanto, cada tecnologia de saúde deve ser analisada levando-se em conta se ela auxilia o médico a cuidar do paciente com eficácia ou se ajuda o paciente a cuidar de si e mostra resultados favoráveis e comprováveis. Se aplicarmos esse raciocínio às tecnologias disponíveis atualmente, apenas uma parte incrivelmente reduzida realmente cumpre o que se pede, particularmente em saúde digital. Elas simplesmente não ajudam os médicos a cuidar dos pacientes e não permitem obter resultados mais favoráveis.

Que tipo de suporte a SoPE dá aos médicos na organização ou no financiamento para empreender?

Meyers — A SoPE é a maior rede global, sem fins lucrativos, de empreendedorismo e inovação biomédica e em saúde. Nossa missão é ajudar os membros, cuja maioria são médicos, a fazer suas ideias chegarem aos pacientes. Para isso, providenciamos educação, recursos, rede de contatos, mentores, aprendizado experimental e acesso a pessoas com capital para investimento, em um esforço para ajudar a impulsionar suas ideias. Fazemos isso a partir de uma rede internacional e oferecemos suporte a empreendedores para concretizar suas ideias.

E isso inclui também consultoria na área marketing?

Meyers — Sim. O conceito de empreendedorismo médico engloba vários elementos. A área de marketing e vendas — seja de uma entidade, consultório ou outro negócio ou de um produto voltado ao sistema de saúde — está dentro do espectro de competências que ensinamos. Também ligamos nossos membros aos especialistas em cada campo. Nossa vocação é criar plataformas de apoio ao empreendedorismo.

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Sarfaraz Niazi O ‘Senhor Moustaches’

O indiano Sarfaraz Niazi, CEO da Pharmaceutical Scientist, foi considerado pela Forbes “o homem mais revolucionário da saúde”. Mas, Niazi — e seu bigode que se tornou marca registrada — é também um executivo fora dos padrões.

Sarfaraz Khan Niazi não é o típico CEO. Não esperem dele a tradicional foto de gravata, terno, de braços cruzados, na usual pose de liderança. A personalidade de Niazi tem o reflexo perfeito na sua imagem. O bigode, os chapéus e os suspensórios estão estreitamente identificados com a postura do homem que a Forbes considerou “o mais interessante e revolucionário do mundo da saúde, em 2014”.

O indiano, natural de Lucknow, região norte da Índia, é presidente da Therapeutic Proteins International (TPI) — holding com atuação global na fabricação de medicamentos recombinantes, também conhecidos como biossimilares. Considerado a mais nova fronteira da indústria farmacêutica, esse mercado vem causando furor no trade de saúde pela sua capacidade disruptiva de prover soluções medicamentosas a um custo infinitamente menor. E Niazi e suas empresas são a personificação desse processo. Recentemente, o empresário, escritor e pesquisador radicado em Chicago há mais de dez anos, lançou um novo livro, dedicado ao seu “amigo Barack Obama”. Na obra, ainda sem tradução para o português, Niazi descreve seus esforços em tornar os medicamentos acessíveis para o Affordable Healthcare Act, o “Obamacare”. Para isso, ele sugere ao mandatário americano que acabe com a exigência de testes de bioequivalência para aprovar medicamentos genéricos. Em substituição, o governo deveria usar métodos de teste de equivalência ortogonais, que reduziriam substancialmente o custo da introdução de drogas equivalentes. Como resultado, defende Niazi, se aumentaria substancialmente a qualidade dos produtos no mercado. O objetivo seria ampliar o acesso a produtos biológicos, muito caros e de alta complexidade, para aqueles que não podem pagar.

Segundo o seu fundador, a TPI é uma empresa independente fundada com o objetivo único de ajudar o mundo.“A caridade começa com um coração das pessoas. É sempre importante partilhar o que podemos”, disse Niazi, em entrevista à Diagnóstico.

A redução dos preços dos medicamentos poderia levar as grandes farmacêuticas a enxergar a TPI como um concorrente “desleal”, mas alguns de seus investidores estão ligados a empresas farmacêuticas como a Amneal Pharmaceuticals LLC.

DIFUSÃO DOS BIOSSIMILARES

Um dos desafios para a popularização dos biossimilares é que, normalmente, a sua aprovação demora vários anos após a perda de patente de um medicamento biológico de referência (no Brasil, os biossimilares devem ser chamados de “biológicos”, enquanto os biológicos originais são chamados de “biológicos novos”).

Para perceber o interesse das farmacêuticas nesse novo mercado, basta comparar os custos de produção e de venda ao público de um medicamento de referência, um genérico e o seu biossimilar. Em geral, são gastos em média entre US$1 e 3 bilhões para desenvolver um novo fármaco de referência. Já o genérico pode ser desenvolvido investindo até US$1 milhão. No caso do biológico similar, os valores da produção ficam bem abaixo, em torno dos US$100 a 300 mil. As vantagens vão além. Os biossimilares permitem poupar tempo, já que o período de produção é reduzido para metade ou um terço do necessário em comparação com um genérico ou um medicamento de referência.

Perante a lógica “caridosa” de Niazi e da Therapeutic Proteins International, fica a dúvida sobre a rentabilidade empresarial, mas seu fundador diz que o modelo de negócio é totalmente diferente do universo de produtos farmacêuticos. “Os pacientes nos Estados Unidos estão prontos para os biossimilares e reconhecem os benefícios para o sistema de saúde”, enfatiza o indiano, que espera lançar seus produtos nos EUA em um futuro próximo. Não por acaso, a empresa vem investindo na sensibilização dos médicos e dos consumidores americanos quanto ao valor dos biossimilares e suas virtudes. A previsão da TPI é de que, uma vez que os médicos recebam informação adequada sobre a robustez do processo de regulamentação e tenham uma melhor compreensão sobre a segurança desses medicamentos, a mudança para biossimilares será automática.

Niazi usa a França como exemplo. Desde 2014, a legislação francesa tornou estes produtos intercambiáveis para novos pacientes. “O mercado futuro para esse tipo de medicamento será impulsionado principalmente pelo contribuinte francês”, prevê o empresário. Ele explica que no caso específico da França, o avanço dos similares biológicos está sendo acompanhado pela criação de formas muito mais econômicas de produzir medicamentos.

No Brasil, um estudo da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), publicado ano passado, revela que o governo brasileiro tem investido na produção de biológicos e há uma estimativa de orçamento em torno de R$ 35 bilhões até 2016 para aquisição de medicamentos.

As informações ainda apontam a expectativa de que o país passe a produzir 14 biossimilares para doenças como hemofilia, esclerose múltipla, artrite reumatoide e diabetes. A previsão é de que até 2017, esses produtos sejam integralmente fabricados no Brasil. Atualmente, o país compra cerca de 60% de biológicos.

Até o momento, países desenvolvidos, como Austrália, Japão, Canadá e a maioria das nações europeias, já aprovaram biossimilares no mercado e já os utilizam há muitos anos. Os biológicos já representam cerca de US$160 bilhões em vendas globais. E, por escala, milhões de pessoas beneficiadas. “Apesar de reconhecer o impacto prático das minhas criações, meu maior legado está em conseguir motivar os jovens a ser criativos, pensar diferente e desafiar tudo”, sentencia o inventor, que possui mais 100 trabalhos acadêmicos e 700 livros técnicos e literários publicados. “E isso é mais gratificante do que qualquer outro ganho. Há sempre espaço para criatividade e simplificação de processos na área da saúde”.

Niazi explica que conseguiu inventar um processo que permite a produção simultânea de inúmeros produtos, em uma instalação relativamente pequena, com rápido aumento de escala. A técnica elimina a maioria dos investimentos de capital necessários para desenvolver uma instalação biológica mais tradicional. Trata-se de uma tecnologia que deve, segundo ele, abrir novas possibilidade para os pequenos desenvolvedores de novas drogas, incluindo instituições acadêmicas e governos. “Situações que exigem a produção de medicamentos e vacinas relacionadas com desastres seriam um outro nicho importante para os biossimilares”, salienta o pesquisador, que já ultrapassou a marca de 70 patentes registradas.

GENIALIDADE

“É impressionante a lista de pessoas que o chamam de amigo, desde o presidente do Irã ao presidente dos EUA”, disse à Diagnóstico sua esposa e secretária, Anjum Niazi. “Trabalhar com Niazi é divertido e fácil”, afirma Robert Salcedo, CEO da TPI. “Ele gosta que você tome medidas imediatas e volte com opções diferentes”. Salcedo destaca que a sua genialidade às vezes cria mais ideias do que uma pessoa normal pode lidar. “Ele olha para o mundo a partir de dentro, ao contrário da maioria de nós, que buscamos análises a partir do que é mais evidente”, comenta.

No meio das já numerosas ocupações, Niazi também gosta de partilhar vários pensamentos no seu blog e no Twitter (cujo avatar é um bigode). Um tema recorrente é justamente o Affordable Care Act, definido politicamente por Niazi como um modelo que vem tornando mais acessível a cara medicina dos EUA para milhões de americanos. “O Obamacare foi posto em prática com uma missão de permitir o acesso a cuidados médicos a uma grande parcela de americanos excluídos do sistema, além de fomentar a redução de custos de cuidados de saúde que estão em um caminho insustentável”, sentencia. “É exatamente o que eu almejo com minha contribuição, só que em escala planetária”.

Para Niazi, apesar da complexidade do sistema de saúde nos EUA, o esforço para tornar o mercado mais competitivo tende a beneficiar cada vez mais pessoas. Adicionalmente, acredita ele, normas legais sobre cuidados preventivos e expansão do seu acesso por um número mais alargado da população tem o potencial de reduzir os encargos para o sistema.

“Mesmo assim, o sistema de saúde nacional, universal e gratuito norte-americano é uma utopia”, garante o empresário. Segundo ele, a saúde nos Estados Unidos deverá permanecer como um sistema misto, ainda que mais includente, em um futuro próximo.

No caso de países emergentes como Índia ou Brasil, ele acredita que trazer os padrões de qualidade, mantendo tratamentos com custos acessíveis continuará a ser um desafio para o futuro. “É lamentável que algumas agências reguladoras apliquem os mesmos padrões de qualidade aos produtos biológicos e medicamentos de pequenas moléculas”, critica o indiano. “O resultado desse tipo de política pode ser bem mais prejudicial para os pacientes do que se possa imaginar”. Em dois dos seus livros, “Biosimilars and Interchangeable Products — from cell lines to commercial launch” e “Handbook of Bioequivalence Testing”, Niazi deixa conselhos valiosos aos países em desenvolvimento sobre como formular políticas robustas para garantir a qualidade dos medicamentos biológicos. Isso inclui a ação de certificadores, bem como a vigilância contínua de produtos fabricados localmente. “As agências reguladoras desses países podem desenvolver um caminho seguro. Mas isso exige um novo pensamento”, intui.

Sobre a capacidade de agir sempre de forma disruptiva, Niazi diz que o segredo é aproveitar a vida, algo que considera ser rejuvenescedor. “É preciso ter paixão por algo, o que permite encontrar maneiras de fazer as coisas de forma mais eficiente”, assegura ele, que aos 65 anos de idade acabou de correr pela primeira vez a maratona de Chicago. “Ajudar o próximo também me ajuda a superar as minhas limitações”.

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