Theranos: como uma startup de biotecnologia desceu do céu ao inferno

Técnica promissora de análise de sangue sem uso de agulha, afinal, não funciona. Investigações da FDA, Medicare e Medicaid já decorrem e Walgreen cessou parceria com laboratório. Mais recentemente o hedge fund de São Francisco, Partner Fund Management LP, processou a Theranos por ter mentido para atrair investidores.

A promessa da Theranos era fazer 250 exames diferentes com uma simples gota de sangue, sem uso de agulhas

Elizabeth Holmes, fundadora da Theranos, anunciou ao mundo que tinha descoberto uma técnica revolucionária que iria reinventar os exames laboratoriais e permitiria realizar mais de 200 exames de sangue com uma gota de sangue apenas. A notícia fez correr muita tinta, por isso, não foi espantoso quando, há um ano atrás, a Theranos valia 9 bilhões de dólares. Isso significava que Holmes, detentora de 50% da empresa, liderava a lista da Forbes das mulheres empreendedoras mais ricas da América. Desde o momento do anúncio até à atualidade, a Theranos tem estado envolvida em diversos escândalos, que levaram um grupo de investidores a reavaliar o valor da empresa, depreciando de 9 bilhões para 800 milhões de dólares.

Os problemas da startup se multiplicam. Holmes adotou a tática de Steve Jobs e tentou liderar a empresa envolvendo-a num manto de secretismo. Se a promessa era de realizar exames sem uso de agulhas e rentabilizando uma gota de sangue que serviria para centenas de diferentes testes, desde câncer a colesterol, a realidade foi bem redutora: pouco mais de uma dezena de resultados foram atingidos. Até a credibilidade desses resultados tem sido amplamente discutida, perante a ausência de publicação de estudos e pesquisa. Após as questões levantadas, a Theranos submeteu à aprovação da Food and Drug Administration (FDA) um teste para herpes, algo que provaria que a tecnologia estaria funcionando. Essa seria a primeira de mais de uma centena de aprovações. O resultado saiu totalmente ao contrário, uma vez que a FDA impôs tantas restrições, que a Theranos foi obrigada a suspender os testes.

A Theranos tem sido acusada de fraude, a própria declaração de que seria apenas uma gota de sangue foi dada como falsa. A tecnologia precisa de apenas 3 pequenos frascos, bem menos que os 6 frascos grandes que normalmente são necessários, ainda assim, mais que uma gota. Apesar da ausência de condenações e apesar de não ter visto revogada a sua licença pela Medicare ou Medicaid, está sob investigação após terem sido detetados erros nos exames de sangue. A maior cadeia de farmácias dos Estados Unidos, a Walgreens, decidiu terminar a ligação à Theranos, o que significou o encerramento de 40 operações, só no estado do Arizona.

Os piores desafios que a Theranos enfrenta agora são a recuperação de sua reputação e as promessas de processos judiciais, quer de pacientes, quer de investidores. O Partner Fund Management LP deu o primeiro passo, mas outros já se perfilam. Elizabeth Holmes afirmou publicamente que acredita que vai conseguir atingir os objetivos que definiu inicialmente. Em caso de falência da empresa, Holmes corre o sério risco de ficar sem um centavo, uma vez que acionistas e investidores serão os primeiros a receber indenizações.

Publicado originalmente no Portal DiagnósticoWeb

John Nosta O Consigliere da Google Health

Biomédico americano, John Nosta, é definido como um influenciador e um dos mais admirados disruptores na saúde digital. A si próprio, prefere ser visto como um consigliere — termo eternizado no filme The Godfather – O Poderoso Chefão. Mas do bem.

John Nosta apresenta-se como business consigliere, alguém em quem se pode confiar e que vai ajudar na evolução de seu pensamento e na condução de sua estratégia de engajamento de mercado

John Nosta é mais um caso de sucesso de 2ª geração, imigração europeia para os EUA. Seus avós emigraram da Europa Oriental, da Romênia e da Polônia, e criaram raízes a meia hora de Manhattan, em Perth Amboy (NJ). Seu pai, John T. Nosta, era engenheiro eletricista e apresentou a seu filho o universo da eletrodinâmica, incutindo nele a curiosidade em saber como as coisas funcionam. Rose Nosta, uma CEO do lar, presidia ao conselho de administração doméstico que geria toda a educação de John e sua irmã Nancy. Nancy, oito anos mais velha que John, se tornou uma pintora expressionista abstrata, professora e líder educacional das belas-artes. A criatividade parece ser algo genético nos Nosta, mas no caso de John teve uma forte influência do pai e da lógica científica que norteava sua profissão.

Nosta também tem um lado de facilitador, de tradutor da ciência, da medicina e do digital. Já Einstein defendia que “você não entende realmente algo, a menos que você consiga explicá-lo para sua avó.” E Nosta tem essa capacidade, ele sabe explicar os temas científicas mais complexos para sua avó. Até mesmo em espanhol, idioma que aprendeu ao lidar com a populosa comunidade porto-riquenha de Perth Amboy.

O sonho de John T. Nosta era que seu filho fosse médico. Aos 16 anos, John frequentou um programa avançado de verão em Harvard, em seguida explorou a área de trauma médico móvel, tornando-se paramédico na sua cidade. Estavam concluídos os alicerces para se concretizar o desejo do pai Nosta e o filho Nosta entrou na Universidade de Boston em uma graduação em biofísica. Em seguida, John passou um ano fazendo pesquisas na Harvard Medical School e foi orientado por vários médicos, incluindo o chefe de cardiologia (naquela época) Thomas Smith. Foi ideia do Dr. Smith que John seguisse um programa de PhD. “Entrei na faculdade para estudar fisiologia. Eu sempre tive um grande interesse em medicina, mas descobri que os meus interesses iam bem além da medicina, em áreas como criatividade, arte, filosofia. E acabei achando a medicina, naquele momento, uma área muito chata, em última análise. Eu tive uma oportunidade fantástica em Harvard de falar com algumas das pessoas mais inteligentes nessa área. Tendo esse luxo, não falávamos sobre detalhes de medicina, mas de questões de geopolítica, de amor, de arte.

Mas John estava interessado em explorar uma realidade mais vasta. Então, deixou Boston e se mudou para Nova Iorque, onde se tornou escritor e pensador. Nosta deixou a investigação médica em fisiologia cardiovascular para desespero de seus pais, mas não sem antes publicar com seus mentores, por exemplo, no American Journal of Cardiology. Isso foi algo que lhe deixou ensinamentos importantes, que acabaram sendo a base para sua apetência pela saúde digital.

“Comecei a trabalhar na indústria de ciências da vida, como pensador criativo e estratégico para grandes farmacêuticas. Esse foi o início da minha transição. Foi aí que ganhei competências que me deram um pouco da experiência real para moldar a forma como olho para o mundo e para a saúde e a medicina, sempre muito próximo da medicina e inovação, mas olhando sob uma perspectiva diferente”, conta John Nosta.

Ele acredita profundamente na simbiose entre o poder da capacidade humana e o poder da tecnologia, em como a aliança entre ambos pode melhorar a nossa saúde. E é com entusiasmo e paixão pela saúde digital que fala com outras pessoas sobre o assunto. Uma paixão reconhecida por seus pares, por pacientes, médicos, indústria farmacêutica, pelas empresas de tecnologia, por analistas e jornalistas. Foi escolhido como um dos Influenciadores de Saúde Digital, em 2015, Defensor de Topo da Revolução Digital de Saúde, Pensador Líder de Saúde Digital, Futurista de Saúde Digital e é assinalado como um dos Influenciadores do Top 25 em Big Pharma. John Sculley, ex-CEO da Apple Computers e Pepsi, afirma que “John Nosta fornece uma perspectiva abrangente sobre o movimento de saúde digital. Com sensibilidades únicas para a ciência, engajamento do consumidor e marketing da marca, ele combina a paixão com conhecimento e oferece mais do que um discurso, ele fornece uma conversa engajada que informa e move sua audiência. O domínio do conhecimento de John da medicina, tecnologia e marketing faz dele um observador atento da saúde digital e um dos poucos capazes de articular claramente a importância deste movimento na história da humanidade”. E Gil Bashe, vice-presidente executivo, diretor de prática de saúde da Makovsky & Company, alinha pelo mesmo discurso e acredita que “John é um pensador talentoso capaz de ver peças do puzzle e visualizar todo o quebra-cabeça em conjunto. John é capaz de ver como os clientes de saúde, a viagem do produto e o sucesso se cruzam. Em um mundo digital de convergência, John é um essencial em qualquer equipe Quando John tem uma ideia, ouça!”.

John diz que tenta entender tendências e dados de uma forma básica e fundamental. Depois tenta interpretar dentro de um contexto social ou clínico ou de saúde digital. E acredita que tudo o que escreve vem de uma perspectiva assente numa base factual. Mesmo as pessoas que leem a Forbes ou que assistem à Bloomberg muitas vezes ainda não possuem conhecimento para compreender uma área nova ou emergente e a sua percepção é superficial. “Acredito que os meus leitores querem um determinado nível de análise e uma voz informada que proporcione uma visão mais profunda. Eu gosto de levar as ideias para locais novos e inesperados. Em saúde, isso acontece fazendo perguntas essenciais, olhando para a natureza da inovação e como essa inovação se encaixa nas necessidades clínicas, sociais e financeiras.”

Aceitou integrar o conselho consultivo da Google Health e conta que as suas expectativas estavam em aberto. “Acho que esperamos sempre surpresas da Google. Na verdade, pessoalmente foi uma oportunidade de me sentar em uma sala com pessoas realmente inteligentes e falar sobre o que está acontecendo no mundo e ter essas pessoas compartilhando sua sabedoria comigo.”

Na opinião de Nosta, as empresas de tecnologias vão facilitar grandes avanços em saúde sem nem saberem. Empresas como Google e Microsoft estão atuando no espaço da saúde por existir uma convergência única de múltiplos fatos. “Primeiro, existe uma necessidade urgente, segundo, existe a oportunidade tecnologica para executar. Em terceiro, existe um sentimento de deslumbramento na sociedade, a tecnologia é parte fundamental das nossas vidas e nós a abraçamos de formas novas e emocionantes. Existe também um imperativo moral que nos leva a fazê-lo. Vivemos num momento em que a oportunidade e a tecnologia estão se encontrando”.

A Ogivly foi sua casa durante dez anos, foi chief strategic officer e chief creative officer, o que era uma combinação singular. Muitas vezes os estrategistas são analíticos e olham para o mundo de uma maneira muito factual, enquanto um criativo é mais eclético, olhando para o mundo com uma visão totalmente diferente. “Para mim foi uma oportunidade excepcional para olhar para o setor de healthcare e filtrar a informação através de um cérebro que está sintonizado numa frequência criativa.” Vê a indústria farmacêutica enquanto indústria que muda as nossas vidas e, literalmente, salva vidas. “É extraordinariamente interessante trabalhar para essa área enquanto criativo, pois é também extraordinariamente regulada. Cada frase que sai desse setor é revista cada vez menos pelos criativos, e cada vez mais pelas pessoas dos departamentos legais e regulatórios.” É um desafio, mas John ri e diz que fazemos as coisas, não por serem fáceis, mas por serem dificeis, por serem aliciantes e por poderem mudar nossas vidas.

Redes sociais

“A pasta dental já saiu do tubo e não volta a entrar”. Na área de saúde algumas pessoas ficam nervosas, pessoas que não acham que os pacientes devam comentar sobre a qualidade do hospital ou sobre a competência clínica de um médico. Nosta crê que a inteligência coletiva dos pacientes é tão ou mais inteligente que a do médico. “Vamos supor que um casal tem um filho com câncer. Esses pais têm um conhecimento extraordinário da condição de saúde do filho, das pesquisas sobre câncer e das questões particulares do câncer do filho. Quando esse conhecimento é compartilhado com outros pais que compartilham quer o poder intelectual, quer a experiencia emocional, o que obtemos é um resultado importante, poderoso e profundo que pode acrescentar algo à intervenção que tradicionalmente seria oferecida pela comunidade farmacêutica e clínica para abordar o problema de saúde. Não é algo trivial, é um aspecto transformativo dos cuidados de saúde.” O paciente já está redefinindo a saúde e a medicina como as conhecemos. E as escolas médicas estão treinando médicos para ser menos intimidadores para os pacientes.

Um importante fator de mudança quando falamos no movimento de saúde digital é a telemedicina. “É, cada vez mais, a primeira linha de defesa”, diz Nosta. Representa a possibilidade de interagir com um médico de forma imediata e rápida aos primeiros sinais de doença ou mal-estar, pode ajudar a colocar o paciente no caminho para uma terapia mais eficiente, mais econômica e mais poderosa clinicamente. “É uma oportunidade para providenciar mudanças disruptivas fundamentais na assistência médica, principalmente em pontos de necessidade urgente, como certos países em desenvolvimento, onde as pessoas não têm qualquer acesso a cuidados de saúde, aí a telemedicina pode proporcionar mudanças fundamentais.”

NostaLab — Os avanços na tecnologia são perturbadores, desafiadores e capacitam um novo “coletivo social” que irá mudar a medicina na sua essência. Por isso, o think tank NostaLab propõe a criação de uma nova sociedade médica. A premissa do NostaLab é empoderar inovação através de pensamento estratégico e crativo eficaz. Nosta usa uma comparação interessante: “Por vezes quando você tem uma grande ideia é como piscar o olho no escuro. Você sabe que está piscando, mas ninguém mais sabe. É importante comunicar as ideias de forma eficaz para criar uma estratégia de mercado. Por exemplo, muitas vezes as pessoas dizem ‘se eu construir, os interessados vão aparecer’. E isso não é verdade. Se você construir um dispositivo ou tecnologia de saúde digital, você precisa engajar uma comunidade própria, seja a comunidade hospitalar, médicos, para obter validação, ou conectar com os consumidores ou pacientes e levar a inovação na direção deles. Não é algo em que tenha que escolher um ou outro, por vezes é uma combinação. E pensamos formas de criar marketing e publicidade para ajudar a comunicar isso da maneira mais eficaz e mais eficiente. Convém lembrar que muitas empresas digitais não têm orçamentos grandes e mesmo as grandes companhias que têm orçamentos maiores limitam os montantes disponíveis para testar essas ideias.

É aqui que surge o NostaLab, um grupo de consultores que ajudam a providenciar pensamento fundamental em torno de inovação de saúde digital e também dão segunda opinião a empresas farmacêuticas, agências de publicidade e firmas de RP, que lhes permitem reavaliar suas linhas de pensamento do ponto de vista de alguém que tem uma visão de quem está por dentro.

Business consigliere — O NostaLab não é um anjo, pois não financia. Nem mesmo é um cupido, pois não causa paixão entre projetos e investidores. Nosta encontrou no filme Godfather (O Poderoso Chefão) a definição mais correta para a sua função. É um business consigliere, alguém em quem se pode confiar e que vai ajudar na evolução de seu pensamento e na condução de sua estratégia de engajamento de mercado.

Nosta quer transformar a saúde digital em uma realidade prática para ele, o setor de saúde necessita de plataformas de colaboração para permitir que os médicos trabalhem em torno de processos como investigação, prática clínica, educação continuada, saúde digital e medicina digital. Mais do que IA, ou inteligência artificial, estamos presenciando, graças à tecnologia, o aparecimento de AI, aumento de inteligência.

Para ser pensador, criativo, filósofo, conselheiro, Nosta analisa o seu papel como paciente que ambiciona uma interação com a medicina que melhore a experiência humana e traga mais valor à vida. A medicina não pode ser apenas um meio de solucionar problemas de saúde. Nosta acredita que o digital tem tudo para tornar completamente diferente a relação do paciente com a medicina. Para melhor.

Publicado no Portal DiagnósticoWeb
Publicado na Revista Diagnóstico

2016: o ano zero para a saúde no Brasil

A crise brasileira avisou que ia chegar em 2013, mas só se instalou em 2015. Comércio e imobiliário foram dois dos setores mais afetados. A Saúde, pela sua demanda constante, não sofreu o mesmo tipo de sequela. E 2016? Como será?

No ano de 2013 já se falava na crise que estava chegando; em 2014, o pior estava por vir, mas o Brasil foi sacudindo como podia, evitando que as previsões do ano anterior se confirmassem. Mas, em 2015, não teve mais volta. A crise bateu à porta e decidiu ficar. 2015 foi também o ano da aprovação da lei que permite investimento estrangeiro no setor da saúde. Interessados não faltam. O dólar em alta favorece fusões e aquisições, mas também levanta ressalvas, pois tem impacto negativo na hora de importar insumos, dispositivos e tecnologia, tudo mais caro e diminuindo o lucro. A falta de acreditação e o nível de maturidade reduzido da gestão das instituições também deixam o capital estrangeiro hesitante.

O sistema de saúde brasileiro continua com falta de médicos e de leitos, a população segue envelhecendo, aumentando o número de pacientes crônicos, prosseguem velhos problemas, a luta entre privado, público e suplementar, o “nós” contra “eles” coloca a nu lacunas de gestão e atrasa o Brasil na corrida pelo melhor modelo de saúde possível.

E 2016 tem tudo para ser um ano de mudança, o ano zero de adoção de novos modelos, tecnologias e mentalidades. Será um ano em que muitos poderão sofrer as consequências darwinianas da sobrevivência dos mais fortes e preparados, mas será também o ano em que se poderão vencer desafios e afinar estratégias que melhorem a gestão das instituições.

As consultorias são uma ajuda preciosa em horas de dificuldade; rara é a instituição que não recorre a esse auxílio especializado. Seguindo essa lógica, a Diagnóstico fez o mesmo e quis avaliar 2015 e projetar 2016 junto com algumas das consultorias de topo mundiais.

A Inflação médica é um parâmetro de elevada relevância destacado por Ernst & Young (EY) e PricewaterhouseCoopers (PwC). Para Eliane Kihara, sócia-líder da consultoria da PwC na área de health, “em março de 2015, ocorreu o maior índice de inflação médica já registrado desde 2007, de 18,24%”, explica, recorrendo a dados do IESS. É possível perceber que o setor está aberto a discussões para analisar maneiras de reverter a situação. Novos modelos de remuneração estão sendo analisados. Sistemas de saúde do mundo todo já tiveram que lidar com a alta inflação do setor, portanto experiências internacionais, como o uso do DRG (metodologia Diagnosis Related Group), têm sido consideradas. O aumento dos custos médico-hospitalares poderá ser contido quando houver um compartilhamento de riscos entre pagadores e prestadores de saúde, pois, no atual modelo, quem demanda os recursos (prestadores) não é quem paga por eles (operadoras).

A diretora de consultoria para o setor de saúde da Ernst & Young, Adriana Gasparian, diz que o ano não foi fácil para todos os setores da economia, incluindo a saúde. “O custo do setor está insustentável, ele está numa linha de tendência, que é uma linha de crescimento, decorrente de uma inflação médica alta, muito acima da inflação normal, decorrente não do aumento de honorários, mas de todos os custos assistenciais. Há um descolamento da inflação habitual que afeta todos os players do mercado, sejam prestadores, pagadores, todos os setores”, sustenta a diretora da EY.

Observamos também uma grande movimentação das empresas. Com o aumento do custo médico, o benefício do colaborador, o do plano de saúde, está ficando insustentável nas empresas, portanto, isso está tendo um impacto grande nas empresas. Antes a gente falava de players e providers, mas hoje em dia a maioria das empresas está muito envolvida nessa cadeia e, por isso, elas estão revendo o modelo de oferecer esse benefício de saúde.

Há o aumento de custo devido ao envelhecimento da população. Temos uma população mais idosa, invertendo a pirâmide. A população mais idosa tem doenças crônicas, fica doente com mais frequência, com coisas mais complexas. Isso impacta no custo médico. A receita das operadoras é muito menor, mesmo os hospitais de excelência estão tentando manter a qualidade com um custo menor, mais controlado. Resumindo, os custos referentes à saúde aumentaram bastante, tornando o ambiente bastante desafiador para todos os envolvidos, incluindo aí as empresas dentro da cadeia.

Já Enrico de Vettori, sócio-líder da Deloitte na área de life sciences e healthcare, divide a análise pela área de life sciences, que engloba indústria farmacêutica, dispositivos médico-hospitalares, medicina diagnóstica e materiais de consumo, e de healthcare, relativa a médicos e prestadores. De acordo com Vettori, “o grande ponto de 2015 é a questão das demissões, na medida em que, sendo 80% dos planos coletivos, foi registrada uma demissão na ordem de 100 pessoas por mês. Considerando colaboradores e família, o impacto global no setor é maior. Em segundo lugar, olhando para o plano de saúde dos funcionários, vemos um movimento importante, algo que até há três ou quatro anos não era alvo de cortes ou retenções ou reduções, passa a ter políticas muito fortes, quer na coparticipação, quer na migração para planos de uma categoria maior para uma categoria menor. Houve uma mudança de comportamento que era regra, pelo menos no que era normal em termos de despesas das empresas com saúde.

Ainda assim, nem tudo é negativo. Vettori refere a legislação que passou a admitir investimento estrangeiro no setor de saúde e as consequências que daí advêm. O capital não chega sozinho, ele traz conhecimento, experiência, exigências, como o próprio desenvolve: “Já existem vários negócios em curso. Isso vai energizar, vai ajudar o setor, com uma priorização do investimento em detrimento de outros setores, passando a ser uma opção no meio de outras escolhas de investimentos setoriais. Diante disso, iremos ver uma consolidação de um setor que ainda é fragmentado, dividido entre indústrias, distribuição, prestadores, operadoras. Esse investimento vem mas traz com ele uma gama de outras empresas, da área de tecnologia, de serviços, outras abordagens, como wellness, não é puramente capital e investidor. A reboque vêm mais benefícios, mas esses são dois grandes vetores, novas tendências, que, sem dúvida, vão ajudar a mexer com a ordem natural do setor”.

Mas 2015 merece uma outra abordagem por parte de Cintia Soares, gerente da KPMG, que define como um ano de muito mais discussões e abertura de questões. Para a gerente da KPMG, a participação de capital estrangeiro no setor levou as empresas, tanto hospitais quanto as demais fornecedoras de serviço em saúde, a discutir o impacto e as mudanças nas instituições que podem surgir desta oportunidade. “Sobretudo no sentido de definir o momento de negociar com um fundo estrangeiro ou reavaliar o modelo de governança”, diz, deixando o aviso para não se esperar algo a curto prazo: “São alterações que beneficiam o setor, não agora, mas daqui a dois ou três anos”.

Saúde: Igual ou diferente dos outros setores?

Especialistas consideram o setor de saúde como um dos que menos sofrem os impactos da crise. A abertura para capital estrangeiro e a desvalorização do real trazem boas perspectivas para o setor na área de aquisições. Porém, avisa Eliane Kihara, isso não significa que esteja totalmente protegido. Para a responsável da PwC, “a saúde suplementar, por exemplo, pode sofrer o impacto da crise atual, pois seu crescimento esteve nos últimos anos diretamente relacionado ao nível de emprego no país. Com o aumento do desemprego, espera-se diminuição no número de beneficiários. Se fizermos uma avaliação retroativa desde junho/2011, março de 2015 foi a primeira vez em que houve diminuição da carteira de beneficiários das operadoras”.

O setor público também sofreu impacto. Foi anunciado em julho um corte orçamentário de aproximadamente R$ 12 bilhões. O subfinanciamento da saúde pública afeta o setor como um todo, já que a maioria dos hospitais do país presta serviços ao SUS. O governo também possui bastante representatividade nas compras de medicamentos, podendo afetar também o setor farmacêutico. Além de, claro, afetar principalmente a população, que terá de lidar com filas de espera mais longas e falta de atendimento.

Vettori indica o exemplo do setor da agricultura brasileira, que descolou bem da crise. Por outro lado, o setor da saúde já está tendo transformações e vai ter uma depuração no sentido de ficarem os maiores, os mais competentes, os mais resilientes, aqueles que olham mais para o longo prazo, que de fato valorizam a qualidade e que têm melhor gestão e governança. O setor foi impulsionado de modo a que agora passa a ter a necessidade de uma requalificação e readequação, de uma atualização, principalmente nos aspectos de gestão, governança, de estrutura, de capital, de gestão financeira do fluxo de caixa. O setor está sendo impactado por tantas variáveis, entre as quais o aparecimento de novos atores, que vieram para a área de saúde, e a vinda desses novos atores veio aumentar o nível de exigência. Em life sciences, o impacto do dólar foi muito forte. De acordo com o responsável da Deloitte, é preciso notar que “em materiais médicos, genéricos e outros insumos, o problema não é o dólar alto ou baixo, é o dólar instável. Isso atrapalha muito o fechamento de câmbio de negócios. E tem ainda a questão regulatória de uma Anvisa que precisa se reinventar, na medida em que é necessário permitir o acesso a novas tecnologias e uma agência reguladora que não esteja com esse foco não dá à população local acesso aos melhores tratamentos possíveis”.

Transformações, mudanças, movimentações. As consultoras parecem estar de acordo e Cintia Soares menciona isso mesmo, falando de um setor de saúde “caracterizado predominantemente em relação a mudanças e movimentações, apostando na redução de custos e melhoria da eficiência operacional”. Embora seja semelhante aos outros setores, para a KPMG não é algo comparativo, uma vez que a saúde tem um nível menor de maturidade em termos de gestão profissional e aplicação de estratégias. Tem havido movimentações de parcerias entre players em relação à governança, está sendo discutido como otimizar esse mercado misto, ou seja, como as instituições podem atender os planos de saúde privados e suplementares, também questões sobre remuneração e empoderamento das lideranças, ou nas palavras de Cintia Soares: “Tudo atrás dos restantes setores”.

Eficiência. Essa é a chave que permite abrir a porta de saída da crise, segundo Kihara. As organizações devem tomar ações de investimentos para buscar eficiência operacional, através de melhoria de gestão e tecnologia. O momento é difícil para se tomar decisões sobre investimentos, porém, quanto mais tempo as organizações esperarem, menor capacidade de reação elas terão para ser mais competitivas num cenário de crise que parece que se manterá por um tempo. O investimento estrangeiro é, para a PwC, precioso, principalmente devido à desvalorização do real. As empresas estrangeiras percebem o país como fonte de oportunidades, e é uma fonte de capital importante para permitir os investimentos necessários para a modernização da gestão.

Já Gasparian acredita que o Brasil sai da crise sem o investimento estrangeiro: “Não é essencial. Precisamos buscar relações saudáveis, isso sim. Aliás, o capital estrangeiro é saudável na medida em que ele não se torne essencialmente especulativo, que nem nos outros setores. Estamos mexendo com um bem essencial à população. Deve haver uma monitorização dos órgãos competentes e lapidando a lei”. Mas essa abertura aos investidores estrangeiros pode ter uma influência muito positiva. “Como esse capital está vindo de países com uma eficiência de processos maior que a nossa, pode ser muito útil na busca e construção desse modelo de relação mais saudável entre os prestadores e os pagadores. Até porque os investidores não colocam o capital em algo ruim, o objetivo não é ajudar o Brasil num momento difícil. O Brasil deve aproveitar a chance dessa entrada de empresas estrangeiras para aprender com essas empresas mais evoluídas”, sustenta a diretora da EY, não sem relembrar as particularidades do Brasil: “É necessário tropicalizar a eficiência dessas empresas, não é possível pegar e aplicar uma cultura, isso não vai dar certo. É preciso considerar o cenário brasileiro, o modelo de saúde e a cultura do Brasil”.

Adriana Gasparian recomenda que o Brasil encontre um modelo de relacionamento novo para a cadeira da saúde. Ela descreve o modelo de saúde como sendo essencialmente paternalista e reativo: “Eu trato a doença, espero o paciente estar doente para tomar alguma atitude. O novo modelo é proativo, atua na prevenção das doenças, ou seja, existe um historial do paciente desde a infância, acompanhando e fazendo um trabalho de prevenção. Outra diferença é o papel do paciente, ele tem que ser mais engajado e mais responsável pela sua saúde. O paciente atual tem uma postura muito passiva sobre a sua saúde”. O novo modelo, além da cultura da relação médico e paciente, deve instituir uma a relação diferente entre operadoras e hospitais: “Hoje estão em lados opostos e eles devem caminhar para a colaboração entre ambos, a troca de informação saudável. Não é necessário interferir na ação um do outro, mas eles têm algo em comum: o paciente”. Nos modelos mais maduros, essa troca de informações existe e só beneficia o próprio sistema como um todo, tornando os custos mais sustentáveis.

KPGM e EY concordam na análise do impacto do financiamento estrangeiro. A questão da lei, para que possa ser aproveitada, implica que as empresas estejam preparadas e para isso elas precisam elevar minimamente o seu patamar de gestão. “A salvação não é o financiamento, as instituições devem seguir um caminho de reestruturação, governança com relação à gestão financeira, trabalhar modelos de colaboração. Cada vez mais deve haver aproximação de grupos e empresas em prol de um único tema, como por exemplo, desenvolvimento de fornecedores, compartilhar com a indústria a custificação e remuneração de consumo de materiais e medicamentos”, refere Cintia Soares. No final do dia, o que dita quanto vai custar a saúde é o consumo de materiais e medicamentos, não dá para sustentar a indústria sem fazer mudanças no sistema. Para a KPMG o mais importante será instituir um modelo colaborativo.

No meio das diversas soluções apontadas para escapar das teias da crise, a tecnologia tem sido uma das mais referidas. A adoção de tecnologias de informação (TI) só por si nada garante, como explica Cláudio Giulliano Alves da Costa, diretor-presidente da Folks. Aliás, quando mal utilizadas, essas ferramentas podem ter um efeito nefasto. Existem quatro benefícios básicos da adoção de TI: qualidade assistencial, segurança do paciente, eficiência operacional e redução de custos. Esses dois últimos é que permitem que o hospital tenha um retorno financeiro melhor, por exemplo, tornando mais rápidas tarefas que consumiam largos minutos ou horas, ganhando também eficiência e produtividade. A redução e controle dos custos é consequência do controle total da cadeia, todas as informações estão no sistema. Isso são resultados que, por vezes mais, por vezes menos mensurados, já acontecem e estão documentados. No entanto, para Cláudio Giulliano, 2016 pode ser cedo demais: “Nem sempre quando se investe em tecnologia os retornos vêm no primeiro ano ou no segundo. Em tempos de crise, qualquer ferramenta tecnológica que aumente a eficiência operacional e controle ou reduza os custos é essencial para sobreviver a esse período turbulento. Pode ser que o retorno desse investimento não aconteça em apenas um ano”. Isso não significa que não existam instituições com resultados no imediato, basta que tenham se antecipado na adoção dessa tecnologia. Os hospitais que plantaram isso ao longo dos últimos três ou quatro anos vão colher os frutos agora em 2016.

América Latina

O universo da América Latina, no que diz respeito à saúde, é altamente heterogêneo e exibe uma diversidade de estágios de desenvolvimento e maturidade, dependendo do país que analisamos. O Brasil deverá seguir modelos de sucesso de seus vizinhos e deverá servir como referência para outros.

Enrico de Vettori não tem dúvidas em afirmar que o setor de saúde brasileiro segue o modelo americano. “O Brasil tem um mercado privado mais pujante que a maioria da América Latina, mas alguns mercados deram soluções mais inteligentes do que o Brasil, começam a existir mais soluções na rede primária, mais integrada, em alguns casos não só com o próprio médico mas com a distribuição de medicamentos”, afirma Vettori, ilustrando com o caso da Fundação Carlos Slim, que começa a trazer a rede de atenção primária no metrô do México, e com o caso da Colômbia, onde já existe wellness de prevenção com um forte ataque às indústrias de alimentação, por causa do açúcar e refrigerantes para crianças. “É um movimento global na América do Sul que busca uma melhor atenção primária. O mercado brasileiro é mais descolado e está mais próximo do que era o mercado norte-americano há uma década ou duas”, conclui.

Já Adriana Gasparian documenta sua visão com sua experiência no Equador. Dentro da América Latina, o Brasil tem o maior valor do PIB envolvido com saúde — 10% — mas está muito aquém dos países desenvolvidos. Existem realidades muito distintas na América Latina, até por existirem outros países que estão em diferentes estágios. Tomando o exemplo do Equador, que tem um modelo de saúde diferente do brasileiro, que não é universal, a população que não tem emprego formal, com baixas condições socioeconômicas, não tem direito a assistência de saúde pública. Eles estão num estágio anterior ao Brasil. Gasparian acredita numa diversidade que assenta num plano comum, que se estende a uma escala planetária: “Cada um tem seu perfil, mas todos eles se encontram numa fase de controle de custos, não apenas na América Latina, mas também os países mais desenvolvidos e mesmo os que são inteiramente custeados pelo governo, com planos de saúde universais”.

“O Brasil pode aprender com os seus vizinhos, tem algumas instituições que são referência na América Latina, mas não temos o melhor modelo de gestão em saúde da América Latina”. As palavras são de Cintia Soares, que remete para a reforma feita na saúde da Colômbia, “principalmente dos modelos operacionais, que é onde o Brasil deve mudar, onde devem ser feitos alguns tipos de reformas ou no mínimo uma aproximação do órgão regulador, a ANS, com o Ministério de Saúde, criando mais sinergias entre os dois modelos de saúde existentes.”

A gerente da KPMG segue para a mesma localização e indica o Equador, país que está tomando o Brasil como modelo de elaboração de processos mais eficientes, de otimização e redução de custos e de atendimento a uma parcela maior da população, dizendo que “o Equador tem deficiências semelhantes, faltam veículos, faltam médicos, faltam enfermeiras, mas o Brasil tem uma maturidade maior”.

Brasil não é uma nova Grécia ou uma nova Argentina

Não serão as vozes mais ouvidas, mas a verdade é que há quem compare o Brasil com a Argentina. Outros dizem que o Brasil é uma repetição da recente situação da Grécia. Os mais pessimistas recuam mesmo até a crise de 2001 na Terra da Prata. Enrico Vettori assegura que “existe uma diferença brutal de uma Argentina ou até mesmo de uma Grécia. O que nós temos é uma crise política que está se abatendo fortemente, interesses pessoais que estão atrapalhando os nossos avanços fiscais, mas iremos avançar até porque esses interesses irão ser compatibilizados de uma maneira ou de outra, caso a classe política não tenha a dignidade, a decência ou a presteza de o fazer, o mercado já está fazendo”. O líder da Deloitte prossegue explicando que não é um caso de dominância fiscal, ou seja, quando o Banco Central perde totalmente a capacidade de política monetária”. Por outro lado, ele acredita que chegou ao fim aquilo que designa como “ciclo do populismo e inconsequência”. O momento agora é de arrumação, de as empresas olharem para dentro, para fazer uma reflexão de gestão e modelo de negócio. A crise pode trazer oportunidades, aqueles que estão menos maduros e confiam no amadorismo, na sorte ou empirismo podem sofrer mais, mas os que estão preparados vão superar. Aliás, ele faz questão de deixar um elogio: “O DNA do empresariado brasileiro resiste bem a isso”.

Para a KPGM, na voz de Cintia Soares, a única comparação que deve ser feita é no sentido de seguir o exemplo da Argentina sob o ponto de vista de assumir uma postura colaborativa da saúde com a indústria de fármacos, mas só nesse sentido. Transitar de um modelo individualista para modelos colaborativos em parceria com a indústria. Eliane Kihara concorda que apenas faz sentido comparar as duas realidades em apenas um detalhe: “As famílias argentinas optaram por trocar seus planos de saúde por outros mais em conta. Nessa linha, acredito que este movimento pode ocorrer aqui, vis-à-vis o impacto de custo de saúde no orçamento familiar bem como as famílias irão procurar opções mais em conta de medicamentos também, alavancando o mercado de genéricos”.

Projeções para 2016

O ano de 2016 não será um ano de crescimento para o setor de saúde brasileiro. Cintia Soares prevê que seja um ano — talvez o primeiro grande ano — em que existirá uma mobilização em massa para reestruturar e, aí sim, alcançar a estabilidade para fazer face às dificuldades econômicas. O motor dessa mobilização será o setor privado: “Não teremos mudança nenhuma no sistema público, por isso essa mobilização terá que vir do setor privado”.

“As perspectivas são muito mais positivas, que a maioria dos demais setores da economia”, nas palavras de Eliane Kihara. A demanda por serviços de saúde se manterá ou aumentará, vis-à-vis aos reflexos do envelhecimento da nossa população. “O grande desafio das organizações será o quão preparadas elas estarão para enfrentar a pressão sobre custos em toda a cadeia da saúde, para ofertar uma proposição de valor adequada para o quanto os seus clientes estão preparados a pagar, num contexto de crise”, sustenta Kihara.

Segundo Enrico de Vettori, 2016 vai ser um ano muito difícil, os índices econômicos não são favoráveis, mas o mercado já passou por uma primeira perda do grau de investimento e está preparado para precificar uma segunda. “Não é um cenário econômico ou político positivo, mas é o final de ciclo democrático e esse final é o lado positivo. Houve um bom aproveitamento da liquidez gerada e da caixa existente, mas acabou”, explica, lançando seu vaticínio: “2016 vai ser um ano melhor que 2015 e vai ser bom para as empresas e empresários, primeiro porque vai ter muitas oportunidades, segundo porque vai fazer com que mergulhem nessas empresas e vão sair mais fortalecidos”.

Adriana Gasparian é mais contundente e repele o pessimismo: “Quem acreditar que 2016 é um ano que já está perdido deve fazer as malas e ir embora do Brasil”. Gasparian define 2016 não como um ano perdido ou difícil, mas como mais desafiador. Vai exigir ser mais criativo, mais colaborativo e mais participativo. Pensando nisso, a saúde brasileira e os players da cadeia da saúde têm que se voltar para um modelo participativo, colaborativo e engajador, que envolva paciente, médico e governança. “A saúde não pode dar o ano como perdido, isso significaria que muita gente morreria”, palavras fortes, seguidas de uma mensagem final de otimismo: “Os grandes players de saúde são afetados pela situação econômica, as empresas que contratam planos de saúde são afetadas, mas o Brasil e a saúde brasileira têm chance”.

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6 dicas para driblar a crise na saúde brasileira

Todos os indicadores levam o Brasil a procurar soluções para o cenário de crise que atravessa e que deverá se agravar. Os diversos setores buscam otimizar recursos e diminuir despesas, criar novos modelos de gestão e equilibrar a contabilidade para encarar a tempestade econômica brasileira.

As instituições de saúde tentam se organizar e procuram quem as possa auxiliar. Antônio Carlos Kronemberger, Diretor Acadêmico e de Soluções Corporativas e EAD do Grupo Ibmec, é co-autor do livro “Marketing em Organizações de Saúde” e dá seis dicas para conseguir driblar a crise numa área responsável por quase 10% do PIB nacional. O setor de saúde no Brasil registra uma inflação anual de 18%, o que traduz uma considerável falha entre custos e preços. Exigem-se soluções, são necessárias para não cair no buraco da crise que parece querer engolir a economia brasileira e levar a saúde e suas instituições junto.

Numa lista de importantes dicas, a luz ao fundo do túnel pode ser surgir através de aprimorar a alocação de recursos humanos ou dotar de mais eficácia o tipo de serviços prestados serão preciosas ajudas na hora de superar os desafios que se avizinham.

1.Olhar com muita atenção o sistema de custeio e entender corretamente o negócio

O objetivo é fim de reduzir o gap entre custos que aumentam mais do que os preços, destruindo valor (a inflação médica este ano está em 18%). O que acontece é que os custos aumentaram muito, em função, em grande parte, da tecnologia ser “dolarizada” e o mercado não consegue absorver esse aumento de custos nos preços. É necessário olhar para dentro e ver de que maneira pode se trabalhar esses custos para reduzir esse gap.

A administração da farmácia, chamada farmácia central, que normalmente tem diversos remédios escolhidos por cada médico, deverá ter um número reduzido de remédios de diferentes marcas de um determinado princípio ativo. Dessa forma o hospital tem maior capacidade de negociação junto do fornecedor, tanto para remédios como para insumos, pedindo maior número de um determinado produto de certa marca.

A dose única é um outro exemplo. Por meio de tecnologia, consegue fazer com que a enfermeira vá uma vez só por dia no apartamento ou quarto do paciente e coloque lá todos os medicamentos daquele dia, com o respectivo horário.

2. Alterar o modelo de pagamento dos prestadores de serviço

Mudando o modelo de pagamento com base em atendimento para pagamento por serviço com sucesso/resolução do problema ou fazendo um mix entre os dois modelos. Hoje em dia, o prestador é pago por atendimento. Através do plano de saúde, o paciente vai no médico ou na fisioterapia e são atendidas quatro pessoas em uma hora, pois é pago por atendimento. Se passar a remunerar isso pelo êxito ou pelo mix entre êxito e atendimento, certamente esse atendimento vai ter uma quantidade menor e melhor. Com isto, melhora a resolutividade como reduz custos. É uma operação que agrega valor para toda a cadeia, para o paciente, para o médico e para a operadora.

3. Montar a solução em função do usuário ou paciente e não focar apenas nos recursos disponíveis.

Atualmente as soluções dos problemas são oferecidas de forma isolada e com foco apenas nos recursos disponíveis, quando, na verdade, deveriam ser de forma integrada, sempre com foco no paciente. Por exemplo, quando você vai no médico com dor de cabeça. O médico diz que a causa é um problema de visão e encaminha para um oculista. Você escolhe um oculista, marca a consulta e o oculista analisa e fala que o problema é na retina. Então você vai para um especialista de retina. O especialista de retina diz que você precisa de uma cirurgia, então você tem que procurar um cirurgião. É necessário focar nos recursos disponíveis. Se você efetivamente no primeiro atendimento já consegue encaminhar diretamente, o resultado vai ser mais rápido, melhor e menos custoso, com uma percepção de valor muito maior.

4. Buscar o equilíbrio entre pessoas, tecnologias e processos.

A partir do diagnóstico correto da necessidade, a solução deve ser oferecida por meio do balanceamento entre pessoas (competências), tecnologias e processos. Se for algo simples como, por exemplo, alguém que quebrou um dedo. É um atendimento relativamente simples, baseado em protocolo de atendimento. A pessoa tem que fazer uma radiografia e engessa o dedo a partir do diagnóstico do médico, é algo bem processual. Nesse caso tem mais processo do que tecnologia. Num segundo caso, você precisa de um diagnóstico mais profundo, vai fazer um exame de imagem tridimensional, algo que requer mais tecnologia. Existe um técnico que opera a máquina, estamos falando de um aparelho que custa centenas de milhares de dólares, operada por uma pessoa com um salário de 2 mil reais. Agora, se você vai para uma cirurgia de alta complexidade, é muito mais na competência da equipe médica do que em tecnologia ou processos. É preciso fazer uma seleção, decidir o que é mais focado em tecnologia, o que necessita mais de processos ou o que requer mais competências.

5. Segmentar o tipo de atendimento.

Esta dica complementa a anterior. O atendimento deve ser segmentado com base no usuário, baixa, média ou alta complexidade, por especialidade ou por outro critério que faça sentido e seja relevante. Se você faz o levantamento do tipo de atendimento, isso permite selecionar naturalmente o tipo de assistência, criar uma otimização e direcionar de forma eficaz o paciente, poupando tempo e recursos.

6. Focar mais na prevenção e promoção de saúde do que nos tratamentos.

Partindo do velho ditado “é melhor prevenir do que remediar”, sai muito mais barato acompanhar o paciente que sofre de pressão alta, estimular para que faça exercício e tenham uma alimentação regrada, do que depois suportar o internamento. Apostar na educação das pessoas para que sigam um estilo de vida saudável e dessa forma não necessitem, por exemplo, de internamento. Olhando para o caso da AMIL, ela percebeu que 5% dos seus segurados correspondia a 35% dos seus custos. Esses 5% correspondiam a doenças crônicas, diabetes, hipertensos, que necessitam ir regularmente ao hospital e requerem tratamentos constantes, então, ela criou um produto que corresponde a um atendimento diferenciado, na sua rede própria e tem uma abordagem preventiva. Essa solução representa uma redução importante nos seus custos.

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Publicado na Revista Diagnóstico

Louise Benson: “A criatividade é um impulso para o negócio”

Para Louise Benson, diretora do Lions Health, premiar campanhas em saúde é o melhor meio de mostrar que é possível fazer sucesso em um ambiente de publicidade regulada.

O Festival Lions Health nasceu em Cannes, em 2014, do ventre do mais conceituado festival de publicidade do mundo. Considerado o mais importante prêmio da publicidade mundial, o festival chama o mundo criativo à cidade mais badalada do sul da França desde 1953. A primeira edição do prêmio para a área de healthcare coroou nove participantes brasileiros. Este ano, o país trouxe 17 leões. A Diagnóstico conversou com a diretora do Lions Health, Louise Benson, logo após o festival, que acontece todos os anos no mês de junho. Além de exaltar o poder da criatividade para ir além da comunicação e alcançar resultados em saúde, ela diz que o país já se consolidou como um dos grandes da publicidade mundial também quando o assunto é o mercado de healthcare. “O Brasil é claramente um país no qual devemos prestar atenção”.

Por que vocês decidiram criar um festival dedicado à área da saúde?

Louise Benson – Acreditamos que a criatividade é um impulso para o negócio, para mudança e para o bem, e que é tão relevante para o setor de healthcare quanto para qualquer outra indústria. O enquadramento regulatório em que operam as agências no espaço da saúde pode ser considerado restritivo quando falamos de criatividade. Nosso objetivo é mudar essa opinião, ajudando clientes e agências a compreender o valor de produzir trabalhos criativos.

Como o festival contribui para estimular a criatividade em um mercado com tantas restrições?

Benson – Divulgar o trabalho é uma das melhores formas de estimularmos a criatividade. Os delegados que participam no festival veem apresentações e exposições de vários pontos do globo – o que é realmente uma oportunidade exclusiva de colher ideias e se inspirar. Nesse sentido, o festival este ano vai oferecer quatro correntes de conteúdo, com os temas de inspiração criativa, grandes questões, ferramentas criativas e inovação, além de concentração do conhecimento. Nelas, serão analisados os temas mais prementes e os desenvolvimentos mais empolgantes do setor de healthcare.

O Festival de Cannes foi a grande inspiração para o prêmio?

Benson –Nosso festival de referência, Cannes Lions, premia a criatividade há mais de 60 anos. Decidimos usar o quadro existente, com o conhecimento e o alcance adquiridos, para criar algo único para a indústria de healthcare. Nosso sistema de prêmios tem um julgamento que resulta em vencedores que lideram o esforço de determinar o futuro da indústria. Nosso programa de conteúdo oferece a melhor e mais atual plataforma para palestrantes de classe mundial partilharem conhecimento e ideias.

É possível quantificar a contribuição do Lions Health para a indústria de saúde?

Benson – No futuro, acredito que sim. Afinal, ainda estamos no segundo ano. O que sabemos é que o evento vem propiciando um ponto de encontro para a indústria global. Um networking único em que podemos estabelecer indicadores, olhar para o futuro e estimular cada vez mais intercâmbios. Algo que não existia no calendário da indústria de healthcare.

O público esperado para este ano correspondeu às expectativas?

Benson – As inscrições tiveram um aumento de 30%. Devemos ter recebido 10% a mais de delegados, o que mostra uma indústria que entende o potencial da criatividade. Ainda temos um potencial enorme para crescer, mas estamos caminhando em uma direção bastante positiva.

A presença brasileira aumentou em 90%. O Brasil é o melhor “cliente” do Lions Health?

Benson – O número de inscrições do Brasil duplicou este ano, algo que é incrível. O Reino Unido e os Estados Unidos inscreveram mais trabalhos, mas, no final, o Brasil conquistou mais Leões. Assim, posso afirmar que é o nosso “cliente” de maior sucesso. 

O Brasil conquistou o maior número de prêmios e teve mais candidatos. Como você definiria o status do país no Lions Health?

Benson – O Brasil levou para casa 17 Leões. É um desempenho realmente forte e mostra que é um país que rompe barreiras, oferecendo um exemplo a todo o mundo do que pode ser alcançado. É claramente um país no qual devemos prestar atenção.

Foi uma boa ideia separar o setor de saúde do festival principal?

Benson – A indústria da saúde está limitada por um conjunto próprio de normas e restrições. Queríamos que esse mercado tivesse um lugar em Cannes, mas a indústria nos disse que, devido aos desafios específicos que enfrenta, precisaria de uma plataforma dedicada para concentrar o debate sobre como a criatividade pode efetuar uma mudança positiva no setor. Vemos o Lions Health como a marca de abertura do Cannes Lions. 

Resultados comerciais são um dos critérios principais para avaliar campanhas. Vocês têm ideia do impacto que a primeira edição teve no mercado? 

Benson – É impossível precisar com números. Mas a experiência sugere que o Festival Lions Health já está incrementando a ambição criativa, permitindo que as pessoas façam uma análise comparativa do seu próprio trabalho, um autobenchmarking. 

O FESTIVAL EM NÚMEROS

O Brasil regressou triunfante de Cannes mais uma vez. Na segunda edição do festival Lions Health, as agências de publicidade nacionais voltaram a brilhar na costa francesa do Mediterrâneo, conquistando 17 prêmios no evento que premia a criatividade na área da saúde. O Lions Health recebeu candidaturas de 60 países em 2015, totalizando 1.862 inscrições, um aumento de 30% em relação ao ano passado. A participação brasileira quase dobrou em relação a 2014, passando de 98 para 185 candidaturas, das quais 171 foram inscritas na categoria de saúde e bem-estar. 

O júri do festival Lions Health também teve representantes brasileiros. Em saúde e bem-estar, Ricardo John, vice-presidente de criação da JWT foi o eleito; em farmacêutica, foi Emerson Braga, vice-presidente de criação da Revolution Brasil. Ricardo John destacou a emotividade das campanhas brasileiras como o fator que conquistou a simpatia dos jurados.

Tal como na primeira edição, a categoria de saúde e bem-estar rendeu 16 Leões, dos quais cinco foram de ouro. A eles, juntou-se um de bronze na categoria farmacêutica.

Dois dos cinco Leões de ouro foram para campanhas de marcas de protetor solar – uma da Nivea Sun Kids (da agência FCB Brasil), outra da Sol de Janeiro (Ogilvy Brasil). Os demais ficaram com Granado (Ogilvy), fraldas Huggies (MoodTBWA) e Graac (Ogilvy), organização de apoio a crianças com câncer que recebeu duas distinções em diferentes subcategorias.

Tal como na primeira edição, a categoria de saúde e bem-estar rendeu 16 Leões, dos quais cinco foram de ouro. A eles, juntou-se um de bronze na categoria farmacêutica.

Dois dos cinco Leões de ouro foram para campanhas de marcas de protetor solar. Um foi para a campanha da Nivea Sun Kids (da agência FCB Brasil) e o outro para a Sol de Janeiro (Ogilvy Brasil). Os demais ficaram com Granado (Ogilvy), fraldas Huggies (MoodTBWA) e Graac (Ogilvy), organização de apoio a crianças com câncer que recebeu duas distinções em diferentes subcategorias. 

O Grand Prix de Mobile Lions foi dado à Nivea Sun Kids, pelo trabalho desenvolvido pela FCB Brasil, que levou às praias bonecas que simulam a pele vermelha queimada de sol para conscientizar as crianças sobre o uso do protetor solar.

As campanhas que receberam Leão de Prata foram as da Huggies (MoodTBWA), Nivea Sun Kids (FCB), Graac (Ogilvy), Bayer (AlmapBBDO) e Sol de Janeiro e (Ogilvy). A da Ogilvy para a Sol de Janeiro recebeu também um bronze. Os criativos responsáveis pela Purina (NBS), pela Mars Brasil (AlmapBBDO) e pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (Leo Burnett) também conseguiram um Leão de Bronze, e a equipe da JWT foi premiada duas vezes com o bronze pelo trabalho realizado para a organização de alcoólicos anônimos. 

O Brasil recebeu ainda um Leão de Bronze com uma campanha das Farmácias Sant’Ana, desenvolvida pela Revolution Brasil.